Chora Sertanejo

Quando eu era menino, ouvi muitas vezes minha avó materna contar um caso de um parente nosso, do município de Bom Jesus – PI, que mora na fazenda (naquele tempo, fazendeiro morava na fazenda mesmo) e mandou os filhos estudarem no Rio de Janeiro. Os filhos formaram-se, casaram e ficaram morando por lá mesmo.

Devido às dificuldades de transporte naquela época, demoravam muito tempo para vir visitar os pais. Quando vinham, tentavam levar os velhinhos para morar com eles no Rio.

Eles resistiam, não queriam sair daquela vida boa de interior. Muita fartura, gente para serví-los a qualquer hora, parentes e amigos que sempre estavam presentes para fazê-los companhia, bater um papo sentado no terreiro tomando um cafezinho.

Um dia faleceu a esposa, e os filhos vieram para levar o pai para morar com eles no Rio. Ele ainda quis resistir, dizendo que não queria dar trabalho, que não queria morar na casa dos outros. Os filhos compraram um apartamento, montaram tudo do bom e do melhor, contrataram uma empregada (doméstica) e colocaram o velhinho lá.

Um dia, um dos filhos passando por perto do apartamento, lembrou-se de ir ver o pai.

Chegando lá, abriu a porta do apartamento e encontrou o pai, sozinho, sentado em frente a uma janela, olhando a lua. Com um prato na mesa, ele pegou um maço de fósforos, fez uma fogueira com os palitos dentro do prato e estava chorando.

Aí o filho lembrou que era dia de São João.

Então, em homenagem a esse parente que eu nem conheci, fiz essa poesia.

Chora sertanejo

Essa é a história de um menino

Que nasceu lá no sertão

Ouvindo o berro do bezerro

O aboio do vaqueiro

E o canto do azulão

Brincava no terreiro

De peteca e pião

Tirava ninho de passarinho

De arapuca pegava cancão

Tomava banho no rio

Pulando do rebanção

Fazia cavalo de talo

Pra brincar de vaquejada

Com os filhos do patrão

Sua caneta era a enxada

Diploma, os calos da mão.

Pois tinha que trabalhar

Pra ajudar seu pai a criar

Os seus 18 irmãos

Bebia água na cacimba

Que a onça também bebia

Na sombra do juazeiro

Esperar o gado

Com os vaqueiros, ele ia

Hoje vive na cidade

Num apartamento engaiolado

Está velho e cansado

E também aposentado

Mas quando chove

E da janela, ouve o trovão

Ele não aguenta e chora

De saudade do sertão

Velho amigo sertanejo

Que ama o seu torrão

Eu até sinto no peito

Sua dor e solidão

E se um sertanejo chora

É de saudade do sertão

José Paraguassú
Enviado por José Paraguassú em 16/04/2013
Reeditado em 16/08/2019
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