Você sabe bem

Você sabe bem quando tudo está por um fio,

a navalha que corta mais a alma do que a carne,

os passos em falso sobre cadafalsos,

a exitação de um sussurro no silêncio,

a tristeza que explode na lamparina a querosene,

e em sua vida só fragmentos de uma fotografia incompleta,

paisagens recortadas de um puzzle mal feito,

embriagado num copo vazio da pinga de ontem,

para sentir no espírito o dedilhar do violão choroso,

quando tudo só é saudade aprisionada,

quando as vozes se calam no eco de suas existências,

e tudo em que se pode acreditar se perde na noite...

Você sabe bem quando aquela pessoa se ausenta,

abre brechas no ar antes condensado de memórias,

deixa lacunas em folhas de classificados jornalísticos,

faz estrondos com a mudez de uma garoa cinza,

espreitando a solidão alheia em gozo e dor,

sentindo cada espasmo de desilusão no espírito,

e tudo o que podes fazer é deixar o tempo correr,

águas de um rio na contramaré da natureza,

chutando latas vazias em uma esquina deserta,

economizando a esfera de prata com a agonia de ontem,

para endividar-se na contabilidade de desejos solicitados,

em fontes italianas sem divindades para ouvir preces esquecidas...