Tempo perdido

Nuvens comem vento.

Entardeces cotidiano abaixo

e escorres pelo leito insone

o corpo de rio cheio de braços

afluente sem termo.

E as multidões afoitas de imagens vespertinas

transbordam tuas avenidas em plena hora do rush.

E quem é que te sonha esta hora:

no meio da tarde engarrafada (?)

Quem interrompe o fluxo de teus desatinos

sedentos de mar

e te respira

fazendo sufocar

este mesmo ar que dilacera as coisas

O mesmo ar que

um dia ar-dia.

Este ar

que definha

como todo o resto

em sua prisão de tempo de-va-gar

ar que tardia.

Lembro de lembrar de ti

muitas horas depois,

do dia perdido

e da louça por lavar.

Debatias a política ou um suicídio qualquer

(que ainda se sonha muito apesar de tanto prédio);

bebias algo de inutilidade

e algum sexo eletrônico:

lodo câncrico banhando o tédio;

digitaste mil infâmias

por todos os cômodos da casa

empu-teceste

a madrugada

inteira

arfada.

E ainda estavas lá

encalhado num cruzamento qualquer

de ânsia de preamar

estacionado no fundo remoso d’um igarapé;

esperando na beira de um pensamento

o tempo que não recomeçará...

Harley Dolzane
Enviado por Harley Dolzane em 10/02/2006
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