Longe de sua casa de vidro quem poderá a salvar?
Certo dia foi ousada fugiu de sua casa de vidro,
aquela transparência toda lhe embaraçava a mente,
corria então escandalizada pelos bosques e entre as flores
e derramava cacos finos que espatifavam no chão
suas sapatilhas que outrora
deslizavam no assoalho encerado
agora pisavam no verde, nas pedras e estava contente..
O castelo aos pedaços, tomava novas formas com o vento,
e lapidava o vento nas rochas novos tenteios,
era vida nova, eram novas idéias,
mas ela emudecida, perplexa e perfeitamente graciosa,
já pouco lembrara do espelho e da penteadeira
pouco lembrara de sua linda casa de vidro,
pouco lembrara que vivia com medo de todos,
e que corria de medo do mundo..
Mas ela não podia ser amada,
e muito menos tocada, pois era vidro e cortava,
estava condenada a viver com a boca calada
com seus enormes olhos azuis estrelados
ingênua, doce e terna a observar o mundo atenta.
Ela sofria por ter aprisionado tantos corações
sem poder ama-los , os que tentaram recuaram..
Mas foi na subida dos degraus do castelo em ruínas,
que ela viu o gárgula imóvel, a mover os olhos,
parou em sua frente a observar se a vida lhe daria uma oportunidade,
não entendia o que sentia mas aproximou os lábios,
dos lábios do enfeite, e encostou sua boca congelada
nos lábios do gárgula que se desfazia por magia..
E transformou-se um belo moço o gárgula
e do céu desceu um alazão alado,
e a moça de vidro continuou
estática com os olhos arregalados..
Já com pouco medo de tudo,
com pouco medo do mundo , com pouco medo de todos,
longe da sua casa de vidro,
e presa num castelo em ruínas.