Um Prego

Parado num local,

Tirado de perto dos meus,

Posto numa cadeia sem igual,

Para uma vida presa no que se perdeu.

Fui pego entre montes,

Presa vítima de mãos hábeis,

Levado para um ponto distante,

Tratado de forma rude e grave.

Bateram com força em minha cabeça,

Martelando meu cérebro pequeno,

Tratam-me como ferro para que só obedeça,

Era enterrado em cada pancada em movimento.

Meu corpo foi perfurando,

Meu pé pontiagudo ajudou,

Adentrei outro ser estuprando,

Instrumento que torturou.

Masoquista destino,

Prática de dor,

Depois esquecido,

Escondido com primor.

Uma aresta que passa,

Apanho de novo,

Deformam minha carcaça,

Até que suma do olho.

Inofensivo passivo,

Alguém pisa sobre e se machuca,

Ferem os pés macios,

Sou culpado sem ter tido culpa.

Carpinteiros especializam-se comigo,

Mas em agradecimento me batem,

Fui usado até pra pregar o messias Cristo,

Chamado de símbolo dos covardes.

Virei mito pela utilidade,

Servindo à engenharia,

Construo com grandiosidade,

Também pra ferir sou garantia.

Num movimento posso escapulir,

Indo direto acertar alguém,

Disparado como projétil a fluir,

Arma que perfura além.

Na cama de faquir sou sensação,

Resistem a dor de minhas pontas,

Vazo o bruto em grande demonstração,

Unido a outros pregamos com segurança.

O ponteiro é um prego frustrado,

Apanha muito mais,

Sem conseguir ficar de vez grudado,

Vida de muitos ais.

Alguns de nós perdem a cabeça,

Acabam por isso descartados,

Crânio sem intelecto que enalteça,

Serve de base para ser acertado.

Enferrujamos causando asco,

Perdido nas ruas somos um perigo,

O tétano pode acompanhar nosso rasgo,

Em abrir corpos somos peritos.

Virei analogia de fé,

Dizem aos religiosos que pregam,

Palavras que ficam os fiéis,

Atravessando as mentes que ideologizam.

Furo sendo enterrado.

Apêndice onde me estabeleço,

Parasita que o hospedeiro mantém conservado,

Em alguns casos parece que ali estive desde o começo.

Alfinetes, agulhas, pregos miúdos,

Todos querendo algo penetrar,

Poucos precisam do martelo sisudo,

Um leve empurrão os faz adentrar.

Sou muito mais resistente,

Só com força titânica me rendo,

Subjugado pela união de martelo e gente,

Estratégia que me causa sofrimento.

Apronto com esses conspiradores,

Entro torto estragando a estética,

Arrancam-me com alavanca dizendo horrores,

Sem cabeça só com um terceiro, o alicate que me pega.

Também arranho a marreta,

Atrito entre guerreiros em luta,

Com o tempo ela terá fraqueza,

Deixada de lado por não ter digna conduta.

Empregados são mais pregados do que eu,

Mas se sentem superiores por terem em quem bater,

Entendo e sirvo de bode expiatório que lhes valeu,

Compartilhamos uma vida de dar tudo o que temos sem nada receber.