Olhos da Janela

A noite fria e azul

Trazia nas mãos

O sono

O peso do dia

Torna-se leve

Com a ajuda de Morfeus

Minha cabeça no travesseiro

Voa em sonhos e lembranças,

Neste estado

Entorpecida de sono

Ouço uma respiração perdida no canto do quarto

Me faltam forças

Até para abrir os olhos

Eu sabia que

Não mais dormia

Mas aquele som

Continuava ali

Tive medo de saber

Quem ou o que era

Abri de leve os olhos

E vi um vulto

No canto oposto à minha cama

Sentado e me olhando

Nem ensaiei uma reação

Para isso era preciso

Muita energia

Coisa que me faltava

Mas eu sei que vi alguém

Só não sei quem

Era só uma sombra

Um homem

Estava escuro

Mas eu vi seus olhos

De um azul claro

Que brilhavam na noite

Eu voltei a dormir

Mas a noite

Chega novamente

Fui dormir pensando

Naquela figura de olhos claros

E quem era ele

Nada mais que imaginação?

Mas e se não for?

Meu sono foi leve

E acordei novamente

Com a sensação de ser observada

Mas dessa vez vi

Por Deus, eu vi

Quem era

Um homem

O mais bonito que eu já vira

Cabelos cor de trigo

E ondulados

A pele muito branca

E perfeita

E aqueles olhos

De um azul tão profundo

Me hipnotizavam

Me envolviam

Me seduziam

Quase me matavam

Antes que eu pudesse falar

Ele se aproximou

Quase voando

E pos a mão sobre minha boca

E disse seu nome, Átis

Antes que eu dissesse o meu, ele disse.

Foi se aproximando

Mais e mais

E com o corpo sobre o meu

Ele fechou meus olhos

Me senti flutuar

Como se tivesse desmaiado

Quase na mesma hora

Eu abri os olhos

E ele havia sumido

Levantei da cama

Pensando que era um sonho

Então olhei pela janela

E vi sua imagem

Sumindo aos poucos

Quase sem poder ser vista

A não ser pelos olhos

Eles continuavam lá

Duas faíscas azuis

Voltei a dormir

Pensando nele

Meus pensamentos voavam

Mais uma noite se passou

E mais uma noite

Chegou

Átis apareceu em meu quarto

Mais uma vez, como mágica

Dessa vez conversamos

Me contou de sua vida

De quantos séculos vivera

E de tudo que vira

Me contou que me viu

Certa vez, dormindo

E ficou hipnotizado

Passou a me observar

Sempre no escuro escondido

Até que eu o vi

Olhou pela janela, triste

Precisava ir

Antes de sumir

Olhou fundo nos meus olhos

Pôs a mão em meu pescoço

E me beijou

Me beijou com alma

Se ele a tem

Foi profundo

Envolvente

Com mais paixão do que os outros

Então ele sumiu

Como na outra noite

E eu fiquei aqui

Sem dormir

Inquieta, pensando

Quem é Átis

E assim vinham

As noites e os dias

E toda a noite ele vinha

Toda noite me beijava

E sumia

Como na primeira vez

Já não dormia

Me acostumei a isso

As poucas horas da noite

Depois que ia embora

Eram mais que suficientes

Eram tudo que tinha

No início

Era só atração

Era apenas o que eu via

Mas isso foi crescendo

E foi se tornando

Algo bem maior que nós

Eu sabia tudo sobre ele

E ele tudo sobre mim

Quando estávamos juntos

Nada importava

Nem o tempo

Nem a vida

A vida

Era o que menos importava

Nossa vida era

Os momentos que ficávamos juntos

Me tornei um ser da noite

Aos poucos

Quase sem querer

Nossa força vinha

De nossos beijos

Nossos abraços

Nos alimentávamos

Da energia do corpo

Um do outro

Uma noite

Deitada nos braços dele

Resolvi pedir

Pedir o que eu queria

Desde que soube o que ele era

“Me faça como você...”

Ele me olhou assustado

Como se eu o tivesse apunhalado

“Não”

Foi simplesmente isso

Disse assim

Como se fosse suficiente

Me beijou

Friamente sem nenhuma alma

E se foi, simplesmente sumiu

E eu fiquei

Sem saber o que fizera

Para arrasar com ele assim

Passaram-se 3 noites

Vejam bem, 3 noites

Sem notícias de meu amor

Eu o tinha magoado

Assustado, ou coisa que o valha

Mas a coisa que eu

Mais queria

Era saber o que tinha feito

E o que fazer,

Meu Deus,

Para trazê-lo de volta

Na noite do 4º dia

Eu dormia

Quando, mesmo dormindo

Eu senti

Aquela presença

Fria e ardente

Quando abri os olhos

Lá estava ele

Me implorando perdão com o olhar

E eu negava

Não demonstrando

O quanto senti sua falta

Uma lágrima

Escorreu de seus olhos

Foi a 1ª

Demonstração de dor

Que vi nele

E disse:

“Não me peças

O que não posso dar

A jóia mais cara

Eu roubo do homem mais rico

Um escravo eterno

E eu sou seu”

“Mas não peça a vida que eu tenho

Vivo o vazio da noite

Só, vago nas ruas

Querendo saber

Que preço eu pago

Para não ser mais assim”

“Quando o mundo dorme

Eu acordo e,

Não vejo quase ninguém

O destino me apresentou você

Mas é a 1ª pessoa com quem falo

Em centenas de anos”

“Te amo muito

E não quero que vivas assim

Quero que viva

E não que pene,

Uma existência

Além de séculos”

“E se eu fizesse

E você se arrependesse

Não poderia mais

Olhar para mim

Sem ver a vida

Que deixou para trás”

“Nada me faz mais feliz

Do que ver a vida

Que pulsa em suas veias

Que faísca em seus olhos

Que transborda dos seus bjos

E me enche de paz”

“Me culparia

Até o fim dos tempos

De te tirar essa vida

E te jogar em outra

Mais nebulosa

Mais vazia”

“Viver é difícil

Eu sei

Mas existir por simples existir

Não é difícil

É impossível”

“Por isso, me alimento

Da energia vital

Das pessoas

Que não dão valor

Ao presente que tem”

“Se é isso que queres

Sinto, mas não quero

Não quero que sofras

Nem que mude

E se é assim

Aqui... eu digo adeus”

Ele se virou

Eu o segurei e o abracei

Estava tenso

Tanto quanto eu

O virei para mim

E disse:

“Injustiça

Eu esperei 3 noites

Para ouvir você

Também quero tempo

Dê-me 3 noites

E volte para ouvir”

Ele sorriu

Fez que sim com a cabeça

E me beijou a testa

Como sempre sumiu

Me deixando só

Desatei a chorar

Imaginei o que fazer

Para ter ele para sempre

E de novo para mim

Se tinha tanta certeza

De me deixar assim

O que fazer para mudar essa idéia

A vida não tinha mais sentido

O que me prendia a ela

Era o amor de Átis

Sem esse amor

Nada me impediria , de eu mesma

Tirar minha vida

Será que essa idéia

Seria suficiente

Para convencê-lo

Não

Vou mostrar para ele

Que ele precisa de mim

Os dias corriam

Como se tivessem pressa

Nada podia pará-los

E eu me movia

A passos de tartaruga

Sem forças de tanta preocupação

Abandonei a tudo

E a todos

Pensava horas a fio

Será isso mesmo que queria

Se deixaria ainda mais a vida

Do que já tinha deixado?

O prazo que eu pedi

Se esgotava

E eu estava decidida

Faria e pronto

Eu deveria apenas me concentrar

No que dizer para Átis

Os 3 dias chegaram ao fim

Chegara a hora

A hora da decisão

Não me preocupava

Em não dormir

Já não dormia a dias

De repente

Eu sinto uma presença

E olho pela janela

E vejo

Seus olhos brilham

Como estrelas azuis

Quando menos percebo

Ela já está na monha casa

Me olha com olhos aflitos

Que não escondem um certo medo

Só não sei de que

Era minha vez

De me explicar

A minha vez

De dizer o que sinto

Tentando organizar as idéias

Falei:

“Entendi seus motivos

Mesmo que

Não me agradassem

Então peço

Por favor

Entenda os meus”

“Você teme

Que eu deixe a vida

E culpe você

O que não entendes

É que já a deixei

E agradeço a você”

“Existir sem vida

Pode ser doloroso

Mas existir com vida

E só,

Também não parece

Um bom projeto de vida”

“Você vive só

Eu vivo só

Você não pode

Voltar à minha vida

Mas eu posso

Ir à sua”

“Não seremos mais

Solitários

Nem presos à uma vida

Que não pedimos

Estaremos juntos, e

Juntos seremos livres”

“E se realmente me amas

Entendes que minha mortalidade

Põe limites ao amor

Não o amo mais do que agora

Porque, como mortal

Nutro uma paixão pela vida”

“Nosso amor

Transcende séculos

Mas como estes

Séculos, se

Apenas tenho mais

Algumas décadas”

“Entendo que vivas

Uma vida sombria

Durante a noite

A diferença é

Que minha vida sombria

É conduzida à luz do dia”

“E porque culparia vocÊ

Pela minha nova vida

Se sou eu que que estou aqui

Te pedindo

Quase te implorando

Que me dê sua vida”

“Se não quer fazer isso

Que seja pelo motivo certo

Não porque tens medo ou pena

Mas sim

Porque não me ama mais”

Ele apenas olhou para mim

Pensava que ele iria sumir

E mais uma vez me deixar só

Pensando nele

E apenas nele

Isso não aconteceu

Ele me beijou

Com o mesmo impacto

Das ultimas vezes

Minha boca, meu rosto

Meu pescoço

Então senti

A prova maior de que

Eu o convencera

Senti um arrepio

E me senti em febre

Ao mesmo tempo

Meus olhos se enchiam de lágrimas

Ao mesmo tempo

Que sorria

Senti meu próprio sangue

Escorrer do pescoço

Em minhas veias

Corria um sangue quente

Como nunca correra antes

Como se estivesse dopada

Ia perdendo as forças

Ao passo que me sentia mais viva

Sentia a troca de energia

Entre eu e ele

Sentia como se arrebatada

Por uma onda de confusos

Sentimentos, sentia como se...

Como se morresse

Ele tirou os dentes do meu pescoço

E me olhou fundo nos olhos

Eu enxergava turvo

Mas reconhecia o seu sorriso

Ele me recostou e disse:

“Apenas deslize”

Foi o que eu fiz

Deslizei para dentro de um sono profundo

E denso

Acho que morri

Enquanto isso, lembro-me

De seu olhar e seu sorriso

Quando “acordei”

Lembro da sensação

De estar nascendo de novo

Sentia, via e ouvia

Coisas antes

Nunca percebidas por mim

Lá estava ele

Meu amor, meu amante

Me esperava para

Me dar as boas vindas

Nessa nova

E excitante vida

Me ajudou a levantar

E senti que ele estava

Realmente feliz

Feliz em me ter ali

Em poder me receber

Em seu mundo

A sensação de estar drogada

Não passava

Talvez porque nunca

Iria passar

Com o tempo

Me acostumaria

Ele me pôs de frente

Para a janela

Se pôs atrás de mim

E me abraçou

E como sempre ele sumiu

Desta vez comigo

E foi assim que

Saí da minha vida

Para onde fomos?

Para o mundo

Que agora é

Nossa cãs

A noite é um parque

E nós as crianças

A brincar e descobrir

Por seus vales escuros

Não mais sozinhos

Agora que somos cúmplices

Toda as tristezas do mundo

Eu abandonei

Não me acho covarde

Pois saí de uma vida

Para encarar outra

Bem diferente

Mesmo sendo agora

Mais fácil

Já que tenho meu Átis

Meu amado-amigo

Meu parceiro

Meu irmão

Vivemos um dia como

Se fosse o último

E outro

Como se fosse o 1º

Minha visão do mundo

Mudou completamente

Agora estou do outro lado

Vejo o outro ângulo

Do outro lado da janela

Tudo é diferente

É como entrar

Na casa do espelho

Lembre-se de mim e de Átis

Toda vez que a vida lhe for

Injusta ou infiel

Há sempre os 2 lados

E entre eles uma solução razoável

Nosso amor agora

É perfeito

Transcende os séculos

Como deveria ser

Mas para precisamos

Enxergar com outros olhos

Os olhos da janela...