Sombra de Dromedário

No colo adormecida

tombou boleada a sombra do Dromedário.

Ao lado, corre em baba, o lago. Fio a fio, esquecido

de ser rio. No sangue do ventre, borbulham alvoradas

d’ofídias urgentes. Expedidas do livro antigo das Horas.

No tal em que sombrios cavalos galopam

na voz das esporas.

Em que Unicórnios cavalgam o pranto de turquesas águas,

sempre quietas, sempre paradas, dum aquário.

Cerro a invenção.

Aborto a memória. Olho o Mundo coalhado, de lado e frente.

Impúbere, remoçado. É Primavera! Subo-o a pulso,

no refluxo dos cinco sentidos. Subo e desço, e de novo subo,

e de novo desço. Sem principio ou fim, na busca de mim...

Olho a sombra tombada a meu lado... O Dromedário dorme

acordado. A sombra canta (ou pranta?) .... É Fado!!!

Tudo é simples,

é tão evidente, quando dos montes os olivais se afrouxam

d’algemes. Se libertam no choro macio da pedra das fontes.

E na larga planície,

lá dos corrais se soltam à solta, do bucho e da boca,

carpidos, lamentos, nas vozes dos animais. A tremer de frio...

E se libertam lá nas montanhas as alcateias...

e acasalam em cio nas loucas noites de lua cheia ...

E todas as súplicas, em sintonia, são anotações

da maior loucura. Estripam as veias, lagos e luas

em lúgubres danças. Trevas crianças, envoltas em linho fresco.

Ilusórias sombras, seda carmim. Sede de mim!

Mel de Carvalho
Enviado por Mel de Carvalho em 22/03/2007
Reeditado em 22/03/2007
Código do texto: T421773
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