A PRIMAVERA QUE VOS FALO
Não vos falo de pássaros inquietos,
ou seixos ou flores,
sigo minha rota para além dos muros,
vou disperso sobre a relva.
Não vos falo do sol
que ao tocar, definitivamente,
a pele alva da manhã,
revelou a temperatura das fêmeas.
Vestido de lirismo e de alcova,
procuro uma razão
para subverter borboletas que pulsam
a arvore que transpira.
Não vos falo da primavera
didática dos livros,
nem a que visita
os que tardam seu vôo de nuvem.
Falo-vos da primavera
que não possuo
e escorre para a mansidão
solícita de uma vaga.
Falo-vos de segredos
fugidos das grutas,
falo-vos do hábito
sombrio dos becos.
Das bocas que têm febre
de seus amores
e sede metafísica
de poemas.
Falo-vos, em fim,
da primavera sadia,
recuada no calendário
que não existe mais.