PROFETA
Todas as noites
Que correm nestas veias
Abrem-se ao grande mar:
Imensa fuga do deserto
De um corpo revolto
Em areias caóticas.
Eis a confusão:
Último botão desapertado
Do espartilho humano
Que é o pensamento organizado.
Eis-me primitiva
Pregando a fantasmas solitários,
Iludidos,
Que pensam ainda viver
E brincam
Com a eternidade.
Enquanto falo
As minhas palavras escondem a trovoada.
Anuncio
As chuvas ameaçadoras
Que trazem o corpo nu.
O conhecimento.
Mãos cheias de areia,
Tão cedo vazias,
Lançam ao vento gestos de náufrago
Num mar deserto.
Estas noites,
Depois do sol,
Abrem-me à saciedade de uma prisão:
Liberdade.
Susana Júlio
in Do Mar Grande e D`Outros Mares
Antologia Poética