Experiência  de  morte


Eu nunca havia morrido,
aquela era a primeira vez.
Na estapafúrdia  experiência
orei muito,  orei  aflito
depois chorei,  chorei ao ponto
de sentir dó  de  mim.
Estranhamente  constatei:
Alegres,  os  amigos
enterram seus mortos.
Aterrorizante  é  a  cena
da  pá,  a  terra,  escuridão...
vertigem mental me assoma.
O  que  me  espera?
Como serei  recebido?
Sou  um  morto
muito  bem  vivido!

Oh!  esqueci
minha fantasia de pierrô,
os discos de Sinatra, de Sarah Vaughan,
meu Van Gogh(Girassóis)
minha agenda, o blazer bretão e,
até meus mocassins francêses!
Também, nem fui consultado
acerca de tão tétrica viagem
mas pensando bem,  se  o
tivesse sido,  recusaria.

Ah,  meu Deus!
meu passaporte 
está  sem  visto,  e  na
alfândega  do  espaço,
como provar que eu existo?

Saudades 
de minha baixinha Basset,
meu curió cearense,
do sol de  Fortaleza e,
do  amor  de  Norma.

Na estante de jacarandá
jazem meus  mestres;
Machado de Assis,   Camões,
Dostoiévsk, Pablo Neruda, Kafka,
Fernando Pessoa e  Cecília.

-No  além, que idioma  falam?
Tal coisa me incomoda tanto,
pois bacharel  me  fiz,  somente
em Português  e  Esperanto.
Sinto-me  descompensando,
tudo  escurece, apago-me.
A  fita  finda,  tec...  tec...  tec...

jray
Enviado por jray em 07/03/2008
Reeditado em 15/03/2008
Código do texto: T891768