O PESCADOR DE SEIXOS

O PESCADOR DE SEIXOS

Na vida, sempre caminhei sem realmente fazê-lo.

Vivendo entre a exsudação da alegria

e o amargor do sangue escorrido da decepção, que brotando,

Subjugava o meu peito em agonia.

Caminhar sem realmente provar o sabor do caminho com os dois pés:

daí decorre todos os meus muitos desgostos posteriores.

É como se a cada não de namoro, de amizade mais intensa;

sobreviesse um sim da misantropia, da tristeza, da solidão ferina,

quase indigesta!

Entretanto, como que tomado pelas mãos do auspício, passava a sentir

a pulsação do ânimo sempre quando ia ao encontro dos livros,

da poesia, do feitiço.

Enlevo que vinha á tona ao me chafurdar no universo temático da patologia:

a ter contato com as mazelas, desventuras, desilusões e padecimento

[Padecimento de um oprimido povo. Uma gente que, mesmo vertendo um oceano de lágrimas dos olhos, desafia a subsistência e segue em frente, a viver, como pode, cada instante do seu dia.

Depreendi o quanto eu estava aprisionado numa masmorra de egocentricidade, mesquinharia, tola vaidade.

Pois os meus problemas representam uma pequena gota inócua caída ante uma tempestade

[ Novas e letais tempestades no deserto a ceifar os inocentes filhos do Senhor Islã, chamado, por nós, de Oriente Médio!

Então, assim, num repente de pensamento,

descobri poder dialogar com as minhas dificuldades;

dialogar com adversidades alheias;

dialogar com as infinitas dimensões da filosófica consciência.

E, uma vez inserido dentro delas, em seu âmago,

colher flores ornadas de olor petrificante de aporia.

Banhar-me nas águas petrificantes de aporia.

Contemplar o jazer da ignescência solar petrificante de aporia.

Pescar os tubarões petrificantes de aporia

[Ser o pescador das sensações petrificantes da humana aporia, as quais não se recolhem ao reverberar da noite;

Nem tampouco ao despontar da aurora. Porque são imunes ao hermetismo da natural mediocridade. Desse modo, vivem insones]

Então hoje caminho feliz, sem caminhar a bem da verdade.

Caminho feliz, sem poder caminhar por saber quem sou de verdade

[Sou aquele que pesca a essência daqueles que não podem falar. Daqueles que se furtam em reconhecer a natureza do seu próprio ser:

Da sua própria humanidade.

Pois é aí que se assenta o não caminhar verdadeiro. Este sim, é aquele

de quem devemos ter medo. Afinal, será apenas dessa forma que expugnaremos a tão sonhada liberdade... Sim, plenamente, na verdade... Sim, não havendo mais fantasmas, perversos sonhos. Pesadelos de vertica-

lidade!

JESSÉ BARBOSA DE OLIVEIRA