POEMAS PROFANOS: Profano uma Poeta...

Dedicou Poeta Galega um comentário a um poema meu: «Sim, ferimo-nos, ferimo-nos muito. E dói. Somos apenas névoa, sim, disseminada não sei. Talvez enevoada. Desejo vácuo, vazio, desejos... Vãos. Moléculas de desejos supérfluos a pairarem no ar. Conformam um corpo? Pode ser... ou pode não. Tanto tem. O tempo também nos fere e nos fere. Poderemos alguma vez nós ferir o tempo? Vácuos, não poderemos.» (25/02/2009 17:40 para o texto: Haikais Imperfeitos (XXXV): Amor referido... [3].- T1456966).

E eu, agora, ingrato, profano o comentário da Poeta Galega e digo, sem poesia, mas em (quase) verso:

Ferir, devemos ferir-nos:

Não consiste o amor numa ferida

que sentimos e não sentimos,

mas em que sempre consentimos?

Daí que, sim, sejamos névoa

(água encerrada em corpo transcendente,

mas afinal água, hidrogénio e oxigénio

convenientemente combinados...)

sem dúvida e sem dúvida também

consistente:

Não achas, minha Poeta

Galega, que os sentimentos perduram

e que, por muito que os sublimemos,

nos envolvem pertinazes como mão forte

que nos oprime o coração e o cérebro

e até essas cousinhas subtis e leves,

que insistimos em chamar ideias:

Quando apenas são desejos vaporosos,

a transbordarem, carregados, gordura

de anelos, procura impudente, em jorros

irreprimíveis de requintes, mas frágeis,

mas quebradiços... Vapor de desejos

ao cabo...

E por vezes florescidos

no Tempo, cinzel ingrato

que lento e firme nos esculpe

(como bem assinalaste num poema teu)...

Continuemos, portanto, a ferir,

a ferirmo-nos amorosos...

Desculpa esta profanação minha,

que quisera suave e breve como beijo.