Escravo
"Quando escreve condenado está
à dor e à masmorra.
Porém, se pela palavra certa optar,
pode a algema tornar-se amor
e o suplício, desforra.
Pode assim o poeta até viver,
entre a alegria e a tristeza.
Pode assim voltar a crer
e crer também faz parte da beleza.
Quando, prudente,
escolhe a palavra atada
é o rei da negligência.
Pois é que não, displicente,
pela rima errada
que acaba ser mestre em coerência?
Quando, já cansado, do ritmo e sinfonia,
torna o verbo inacabado
e a estrofe tão vazia.
Pela dor, chora amor, cria ardor,
inala o gosto das flores
e os sons da metria.
O cinza transforma em cores;
do incolor faz poesia.
E assim, prende-se, repreende-se,
escapa de novo dos porões.
E por palavras, inconsciente,
vende-se, rende-se,
mesmo inocente,
aos seus grilhões ..."