Relato 1

Se as lágrimas que choro

fossem capazes de lavar minha alma,

se a angústia que sinto

fosse capaz de livrar o mundo do sofrimento,

se tudo que busquei eu tivesse encontrado.....

Mas busquei tanto e o que encontrei?

Convivo com a dor

– dor não minha, mas da vida.

Diariamente acordo,

corro de um lado para o outro

sem ser capaz de deter a devassidão do mundo.

Os homens matam-se,

sempre mataram uns aos outros.

Consomem-se buscando algo incompreensível,

e já buscavam quando o primeiro espécime

tomou consciência de ser, sem o saber.

A miséria nos assola,

crianças com fome, velhos abandonados.

Populações doentes convivendo, em confortáveis casas,

com o veneno da industrialização.

Destroem-se os rios, as matas,

as flores, os animais, as crianças.

O medo e a incerteza cerram os olhos

que tentam enxergar além dos carros,

das orgias e dos vícios.

Quando ainda pequena,

já em processo de sofrimento

me acreditava instrumento de um poder divino

que tal Joana d’Arc salvaria o mundo de sua alienação.

Entrementes, da bruxa que roubou meus olhos

no sabonete à rainha de trapos da infância

com coroa de catupiri e trono de veludo verde,

cresci e cresceu comigo minha loucura.

Já então, necessitava queimar no fogo minha desonra.

Do julgamento rígido, meu pecado não tinha perdão.

Acreditava-me cumprindo pena eterna.

Era necessário lavar minhas vestes,

torná-la imaculada, quebrar os grilhões

de meus pés errantes para alcançar o perdão do pai eterno,

imagem da pureza, bondade e perfeição.

Minhas vestes não ficaram alvas, mas puídas.

Minha alma não foi lavada e sim tragada pela incerteza/certeza,

misto de loucura e lucidez que me faz crer,

ainda hoje, que filha da luz, um dia retornarei ao meu lar.

Se em tempo imemorável perdi-me nas trevas

e transformada em feiticeira negra e perversa,

tive minha alma volvida do inferno, ainda luto pelo perdão.

Mas é tão difícil.

Tirando-se os símbolos,

a estória se repete.

Urge que eu centralize minha força.

A última batalha nunca será a última.

Liace Garcia
Enviado por Liace Garcia em 09/07/2006
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