A Colher de Pau

Não conseguiu realizar os movimentos que devia

ao tentar subir no banco pra alcançar na rouparia

a colher de pau que de noite com cuidado escondia

enrolada na toalha azul.

Não soube se viajar era mesmo o que queria.

Seria bom ansiar por uma pequena estadia.

Do litoral o navio pelo oceano entraria,

buscando os lindos mares do sul.

A colher mantida enrolada de noite lhe serviria

pra lhe lembrar da façanha que o dia seguinte exigia.

Tamanha a feijoada que ela sempre fazia

sem que tivesse defeito algum.

Porém, era a hora do sonho que a madrugada trazia.

O rosto ficava tristonho, lugares distantes havia

que ela jamais conhecera e, mesmo que fosse num dia,

melhor o pouco prazer que nenhum

Seu povo cantarolava de fome, com a barriga vazia,

enquanto já lhe consome aquela pequena heresia

que era ouvir o seu nome, o que sempre lhe acontecia,

sem que pudesse fugir dali.

Com seu mastro, seu dilema, o poema que a impedia

de fugir de madrugada, mesmo sem muita alegria,

co’a colher de pau enrolada, talvez um pouco sombria.

Haveria pra onde seguir?

O que diria na calçada o mendigo que jazia?

Ao ver a mulher assustada, ele compreenderia

que era pra não dizer nada, melhor fingir que não via?

E ela então seguiria só.

Na beira do cais indecisa, por certo ninguém haveria

além do brilho do mar com a luz que ainda fazia

a lua, que não via nela aquela mulher que sabia

dessa vida desatar o nó.

Mas devo seguir pra bem longe, disso ela se comprazia,

levando essa colher de pau que antes resumiria

a vida que, tola, eu levava e que não terminaria

se eu nunca agisse assim.

Depois de pensar muito tempo naquilo que decidia,

foi que ela viu que o navio nem de longe aparecia.

E mesmo que ela guardasse a colher de pau que trazia

isso também não seria o fim.