Ovos Mexidos

A fome me surpreendeu,

Abri a geladeira à noite,

O povo o que tinha lá comeu,

Não havia nem resto de doce.

Encontrei dois ovos na porta,

Pensei que ali encontraria alívio,

Tomei-os naquela mesma hora,

Fui a cozinha com os preparativos.

Olhei aqueles dois objetos,

Talvez pudessem ter ganhado vida,

Se tivessem outro processo,

Em vez de serem transformados em comida.

Pensava sobre o desenvolvimento orgânico,

Enquanto pegava sal e um pão dormido,

Fui acendendo o fogo como que por encanto,

Ainda estava em dúvida se o faria frito ou cozido.

Um pouquinho de margarina na frigideira,

Uma batidinha no canto da pia,

Logo o conteúdo escorreu de forma ligeira,

O calor fez chiar e a fumaça já subia.

Fiz um movimento e tudo se misturou,

Como minha vida que tudo embaralha,

Cores e formas, tudo se mesclou,

Ao mesmo tempo junto e se espalhava.

Onde começava um ovo?

Impossível identificar.

Onde termina o outro?

Tudo num duplo estalar.

Ovos mexidos,

Me pergunto se mexia eles,

Ou eles mexiam comigo?

Me questionei diversas vezes.

E o cheirinho que abre o apetite,

O pão que abri com movimento de faca,

Recebeu o recheio e ficou menos riste,

Ainda pensei nas aves, sina malfadada.

Hoje me alimento deles,

Amanhã outros seres de mim,

Digerindo e tonando fezes aqueles,

Amanhã bicarão a terra que é meu fim.