I- Travessia do Espelho
 
Meu coração aprende com o trabalho da árvore
O ofício que ela soube do Sublime Mestre Artesão.
De dia capturo a luz e dela tiro meu combustível.
Como abelha, fabrico maciços blocos de energia,
Contribuinte que sou do inconcebível universo.
 
Meu coração aprende com a imobilidade mineral,
Vendo na pedra imóvel sua lenta e segura transformação.
Em seu íntimo, o ígneo espírito do universo trabalha,
Presidindo o processo pelo qual a matéria bruta
Ganha mérito para se tornar matéria orgânica.
 
Meu coração aprende com a efemeridade das mariposas,
E a quase eternalidade do majestoso rei carvalho.
Daquelas aprendo prudência, este me ensina paciência,
E com a humildade suntuosa dos que cavalgam a luz
Meu coração faz a travessia do espelho.
 
II- O Parto da Luz
 
Meu coração aprende parindo a luz,
Num exercício simples de potência adquirida.
Nele, a natureza nua, diáfana, donzela mineral,
Observa, de longe, o pássaro chocar o ovo,
E de perto, assiste a àrvore parir a estrela.
 
Meu coração aprende subindo degraus de evolução,
Desvendando o segredo das coincidências cósmicas
E nelas acrescentando o valor da continuidade.
Meu coração conjuga o Verbo Fundamental
E a montanha lhe revela seus mistérios.
 
Meu coração aprende espionando a Natureza,
Em seu momento de mais total intimidade.
Como um menino pelo buraco da fechadura,
Espia a Mãe se despindo para o Amor.
Meu coração é cúmplice da curiosidade,

 
III-  Pluralidade e singularidade 
 
Meu coração aprende observando a singularidade
Sem, no entanto, perder de vista o que é constante.
Do microcosmo adquire as propriedades,
Do macrocosmo desvenda a identidade.
Meu coração é a sintese da eventualidade,
Onde o universo se repete a cada instante.
 
Meu coração aprende recusando a semelhança,
Sem, no entanto, descartar a existência da identidade.
Ele sabe que no sincronismo das ações universais
Foi garantida a existência da pluralidade.
Meu coração aprende no silêncio das estrelas
A canção que elas modulam na eternidade.

Meu coração aprende bebendo orvalho inocente,
Destilado na básica manhã do universo.
Experimenta a emoção cósmica de embarcar
Na sua primeira aventura mágica.
Meu coração, temperado em sal celeste,
Gaseifica, coagula, evapora-se em espírito.
 




 
João Anatalino
Enviado por João Anatalino em 04/10/2011
Reeditado em 04/10/2011
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