No Meio da Praça
Meio tola e sem graça,
no auge da escuridão,
no meio da minha pirraça...
Mas toque na minha mão,
me leve pro meio da praça,
pois quero ver meu balão
subindo orgulhoso, com raça
no meio da escuridão.
Alcança depressa o vazio
daquele céu estelar,
aquele veludo sombrio
que não se pode tocar.
E cresce, padece o gentio,
querendo acreditar
que alguém vem salvá-los do rio
na hora de se afogar.
Cada vez mais arredio
naquela subida invulgar,
vai meu balão, eu espio
onde ele não vai chegar,
mantendo aceso o pavio
pra força não acabar,
sabendo que nele confio
até onde a vista alcançar.
Meu balão se despedaça
ao toque daquela mão,
mas lá em cima ele passa
no meio da constelação
de estrelas numa vidraça
que exibe a ostentação
da vida maior e sem jaça,
uma sublime invenção.
Aqui embaixo, deploro
o que acho dentro de mim.
Mas lá em cima, imploro
que ele alcance o fim,
por mais que ele seja ilusório,
por mais que ele seja ruim.
Não ligue pra mim se eu choro
ou rio de coisas assim.
No meio da praça, eu minto
que a mão que a minha aperta
o faz com calor. Eu pressinto
a fome que ela desperta.
Querendo abafar o que sinto,
querendo ser descoberta,
aí é então que consinto,
sem me importar se estou certa.
Enquanto lá vai meu balão,
buscando chegar no infinito,
buscando a resolução
daquilo que nunca foi dito;
atrás de uma explicação
pro dia que não é maldito,
atrás do clamor da paixão
da prece de São Benedito.
Rio, 22/08/2005