Chuva na noite

Ouço bem...

cai a chuva. Não é nenhum ôlho do céu que chora.

É a transcendente alma da terra que fala.

Essa é a sua voz. A mesma que a minha, que a tua,

que a dos campos e dos mares.

Por que é preciso gritar. Bem alto!

Pedir socorro pelo que se sente, na impotência

de se medir o peso dos desequilíbrios,

as múltiplas cores da vergonha,

a espécie afundada na covardia,

diante da fala mansa das inverdades.

Ouço bem essa chuva.

Nessa noite de março.

Uma chuva de março,

e sua verticalidade musical

sobre os ombros verdes do planeta.

Um animal em angústia

pela desmoralização da sua caverna.

Patético canto que me curva

em minha escuridão interior

em busca da luz que se vê ao longe

como uma miragem no deserto:

tenho que chegar até lá!