solaris (ou pauliceia encabulada)

os pássaros silvestres

seresteiros matinais

retirantes das planícies pulverizadas

na primavera

juntam sons e plumas do campo

ao grasnido incolor

e ao cinza-cidade

dos pardais

a bruma branca de outono

mascara a nuvem química

das chaminés

o plasma da mistura final

levita parabólicas e delírios

acima de tuas marés

as rubras tardes de inverno

refletem imparciais

no esgoto de teus rios retificados

e no fluxo de metal

das marginais

teus habitantes, então

ah, teus habitantes

apressados e frios cidadãos

podem gelar como as noites de julho

ou derreter em frenesi

qual tantas tardes de verão

no bixiga também

a noite não tem calada

a malta resiste

em muitos focos

à onda fria

da madrugada

teus segredos, teus desejos

não vais revelar tão fácil

a quem não teime conquistar-te a razão

escondem-se atrás do pudor de fogo

de tuas sóbrias meninas

e na simetria geométrica

do teu horizonte de concreto

liquefeito nas lágrimas

da tua garoa-emoção

Publicado no livro "cio do século" (2011).