Divagações sobre o sentido da existência

No mais simples dos fatos é que há o maior horror:

As coisas existem!

Eis o horror inefável que me consome:

Por que motivos há pedras e areia sob meus passos abstratos?

E um mundo cheio de seres preso dentro do existir?

Por que há um universo?

Por que há o que há?

Por que há o que não deveria “ser” ou “haver”?

Por que o que não há ainda há?

E por que o mundo é vivido e constituído dessa forma?

O que é “Existir” (não nós e o mundo), mas “existir-em-si”?

O horror gélido de me sentir vivo,

De me sentir um sonho parido pela ilusão.

Não é propriamente a dor de duvidar ou questionar,

Nem é a aflição apenas de não saber...

É muito mais o pavor avassalador de ter visto o mistério face a face,

De tê-lo visto e compreendido em toda a sua infinidade angustiante de ser indecifrável.

O cheiro da Existência exalando incompreensões

insondáveis em todas as coisas,

Meus pés caminham o abismo espinhoso da Existência,

E minha atormentada alma (por nada entender)

Evade-se sem minha permissão de meu corpo a fim de viver;

Mas o que é deveras viver?

Minhas mãos, perplexas, tocam o meu rosto e as coisas,

E meus olhos duvidam de minha própria Existência,

e todo o meu ser é um penhasco impalpável e transbordante

de perguntas, paixões, medos e questionamentos.

Para mim, ser é espantar-me e admirar-me pelo fato irrevogável de existir;

E tudo isso atormenta minha consciência conscientizada.

Ao olhar para o mundo,

Tudo me parece tão irreal e inacreditável,

E minha razão fica totalmente entorpecida e confusa.

Pessoas indo trabalhar, fazendo sexo,

Lendo livros, dirigindo automóveis,

conversando sobre qualquer assunto,

Tudo isso me parece tão estranho,

Toda essa vida é tão gratuita e desconexa,

Tão difícil de acreditar,

Mesmo estando vendo,

Mesmo vivendo, a vida sempre parece uma outra coisa!

Por tanto olhar e analisar a tudo,

Eu vejo o rosto desdenhoso da Loucura em Tudo,

Em absolutamente tudo: dentro e fora de cada ente,

Dentro e fora de dentro ou de fora!

A Loucura de haver consciência e pensamentos,

A Loucura de haver a própria loucura.

Minha consciência é um terrível tribunal:

Ora meus outros “eus” me acusam, me difamam,

me caluniam, me ameaçam;

Ora meus outros “eus” advogam em prol de minhas causas,

de meu caráter, de minha índole...

Minha consciência é um terremoto

O qual destrói as ilusões palpáveis das coisas,

dos prédios, das casas, das ruas, das imagens.

Tudo isso soterrado dentro de mim

como se tais escombros existissem mesmo.

O Mistério não é a inexistência de Deus,

O Mistério é a substância de Deus antes do próprio Deus!

O meu pensamento penetra em todos os abismos inacessíveis da Vida...

Quando meu pensamento acorda para o mesmo picadeiro absurdo

de milênios atrás (o palco de existirmos e sermos)

Sinto que minha alma quer permanecer dormindo dentro de mim,

Contudo não é apenas minha alma,

Na verdade é tudo em mim.

Ver cada pensamento se afogando em milhões de incompreensões,

Que tortura tu és, ó Vida!

Ver e pensar?

Delírios insanos são todas as realidades,

tangíveis e intangíveis.

Sinto que as palavras as quais escrevo

São muito mais reais do que o próprio autor que as escreve.

Sinto deveras isso,

E uma agonia atroz flagela meu interior sem piedade,

Sem remorsos.

Quando testemunho duas almas carnais se beijando,

Enlaçadas pela loucura de querer se amar,

Sinto tanto nojo, repulsa e fúria,

Sinto vontade de vomitar e escarrar em suas faces,

E em toda a humanidade;

Contudo o pior desprezo, desespero e ódio esperam-me em meu quarto.

Onde está o Cálice da Existência

onde estão diluídos com vinho todos os segredos e mistérios,

da vida, do Mundo, do Amor e do Universo?

Ânsia torturante fabricada pelo desejo de possuir o que não se tem,

de querer ter o que jamais existiu,

de sonhar em encontrar a ilusória Verdade de tudo.

Será que devo acabar com toda essa minha dor agora mesmo,

Ou devo continuar existindo?

Sim, é isso mesmo: fui predestinado somente a existir e a pensar,

Jamais a viver toda a exuberante seiva da vida.

Quem, ou o quê, eu sou?

Sou uma Hipótese sem alma,

Sou uma Conjectura palpável;

Sou uma Miragem diante de meu próprio reflexo;

Sou uma Fábula escrita sei lá pelo quê, ou por quem;

Sou um Verbo inconjugável.

Quero viver a vida sem saber que a vivo!

A minha cruz quase insuportável de se carregar

É não poder fechar os olhos da consciência para essas realidades factícias.

Meu corpo quer dormir, não acordar tão cedo;

Porém minha alma incendeia todo o meu ser com labaredas verbais de perguntas e dúvidas.

Filhos legítimos da ignorância e da estupidez:

Quanto mais fugimos de nós mesmos

Mais nos encontramos aonde quer que estejamos.

Ó ser-em-si, é impossível escapar de ti!

Onde reside o Amor a fim de que tenhamos algum alento?

O amor é sempre algo incompleto,

Assim como todas as demais coisas da vida.

Amar é estar ausente de si mesmo,

Ou amar seria estar mergulhado dentro do que se quer?

Amar é não está mais satisfeito consigo próprio.

Toda a Vida é um breve momento,

A vida é um dia passageiro e fugaz;

E a sepultura é o nosso leito eterno.

Portanto, meus irmãos revoltados e inconformados,

Bebamos cada essência da vida antes do sono final,

Para esquecermo-nos de nós mesmos e de tudo.

Raciocinei veementemente até encontrar a verdade,

Achei-a, contudo a entendi menos ainda.

Por que então buscar sistemas inúteis de filosofias, religiões, dogmas,

Falsas certezas, convicções mendazes

e mais e mais ideias e definições,

Se o Erro é o destino de nossas vidas?

Tudo no mundo, na Vida e no Cosmos é controlado e regido

por Erros e Mentiras perfeitos.

A verdade é apenas uma ideia

a qual não tem realidade em si mesma.

Crer talvez seja viver e morrer;

Pensar é duvidar;

Por isso duvido de tudo,

Duvido se duvido quando imagino duvidar ou não duvidar!

A fé é isto: o pensamento a querer enganar-se eternamente;

Quer na ilusão da Verdade, quer na desilusão.

Sou a Insânia da dor e do excesso de pensar,

Sobre o Livro ilegível e medonho entregue pelo mundo em minhas mãos.

Eu bebo compulsivamente todas as formas,

Ingiro o vinho de todas as ideias, descobertas científicas,

Bebo todos os mistérios e todos os horrores do mundo.

E que intensa azia de “Existir” queima meu estômago metafórico.

Eu queria nem viver e nem morrer,

Nem sentir e nem ficar sem sentimentos.

Sou o Ápice de todas as contradições.

O crime inexpiável de ter razão ou de não tê-la,

O crime de existir e fitar-me, absurdamente, que de fato existo.

Ideias e sentimentos desconexos transpiram

de todas as partes de meu corpo hipotético.

Há uma luta incessante entre o que eu penso,

E o que eu sinto e desejo;

Nesta arena de sentimentos e ideias que se combatem

violentamente entre si.

Logo, dormir para esquecer seria uma breve ilusão,

Seria mais uma fuga inútil,

Pois viver é conjunto de distintos métodos de fuga.

Só fui feliz quando mal pensava,

Ou na inocência de pouco pensar!

Quando inocente e infantilmente acreditava,

Quando delirava em ilusões agradáveis esta vida sádica,

Quando idealizava a vida, os campos, as pessoas, as ideias!

O mistério da Existência é muito mais profundo

do que imaginei o vazio do mundo,

É muito mais imensa, gritante e sufocante

a vacuidade indescritível de minha alma.

Ó meu Deus que sempre existiu sem causas e efeitos!

Que casa é essa? Que planeta é este? Que seres são aqueles?

Onde afinal de contas nos jogaram e nos esqueceram?

Ó estrelas, ó solidão, ó amor: onde nós achamos que estamos?

Gilliard Alves
Enviado por Gilliard Alves em 30/10/2021
Reeditado em 31/10/2021
Código do texto: T7374972
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