Ode desértica
Nas terras áridas onde pereceram os jardins,
Cantam os sussurros do vento que geme:
É uma melodia desolada que a tudo teme,
É um lamento ancestral que não tem fim.
No horizonte, ecoam trovões e relâmpagos,
Uma vastidão áspera que se estende além
Das veias da terra, o sangue triste dos âmagos
Da bondade e da redenção, perdido também.
O silêncio grita, neste crepúsculo de vinho,
Ecos de palavras enterradas pelo tempo.
As sombras copulam entre cactos e espinhos
Em uma dança macabra do esquecimento.
Os homens de olhares vazios, almas quebradas,
Vagando pelas estradas sem rumo ou destino,
Lutando contra o mundo, sem pão ou espada,
Em busca de respostas num mundo tão assassino.
A poeira dança com as sombras sombrias,
No horizonte vermelho onde o sol se deita!
A solidão grita nos ecos do silêncio dos dias,
Enquanto a noite devora a alma desfeita.
Os rios sangram pedras, a terra é devastada,
A esperança escapa como água entre os dedos,
E a morte cavalga com sua máscara enfaixada
A levar e a trazer consigo nossos medos e segredos.
Os rios secaram e as florestas pereceram
Sob o peso cruel do destino implacável.
Um mundo em ruínas, sem vida ou alegria,
Só massas de zumbis neste mundo incurável.
Na vastidão desértica, a alma caminha
Cada passo marcado pelo desespero,
A busca incansável por algum sentido
Num mundo que se perdeu por inteiro.
Os raios que rasgam do céu essa fealdade,
Gorjeia um lampejo de beleza sombria,
Vede: é a poesia nascendo da infertilidade,
É a chama que brota queimando na noite fria.
Embora o onipresente escuro seja tão nefasto,
O ser pode desenterrar de si a chuva e a canção,
E criar uma ária aflita e solidária no vazio vasto,
Um brado eucarístico que comungue nossa solidão.