Filhos de Prometeu
Precisamos partir,
Quem é louco de ficar?
Quem não quer ir até lá em frente,
E depois de ali mesmo, para mais adiante,
Se distanciar?
Mas o que há ali depois além?
Como vamos saber se não quebrarmos os espelhos?
Quem é louco de querer se queimar para sempre?
Como vou saber se não te deixar?
Precisamos partir
Eu e tu
Tu e eu
Eu sozinho, que vá!
Nós não podemos ficar,
É a única coisa que não podemos fazer,
Pois não suportaríamos,
Não te suportaria eu,
Na me suportaria a mi tu...
Eu preciso ir,
E se você não quiser ir agora, tudo bem,
eu vou, tudo bem?
Um de nós tem que ir, ver o que há lá na frente,
Ver se há arvores nascendo,
Crianças chorando primeira vez,
Ninguém pode suportar isso que nos tem matado,
Esse dia que não amanhece,
Nem enoitece,
Essas aves que nos espiam de galhos enferrujados
Precisam ir embora,
Precisam, seu olhar no pesa demais em nossas almas...
Alguém precisa ir lá na frente,
Descortinar o mistério, ver se tem mistérios...
Preciso ir, você não vai?
Estamos tempos demais um com o outro,
Não temos poesias novas,
Todos os poetas estão ultrapassados,
E esses que passam a língua nas folhas de livros encardidos
Estão envenenados...
Não existe mais aquele fogo, aquele frio, só mormaço,
Não, as panelas estão cheias de podridão,
E o ar que respiramos anda carregado,
Precisamos mesmo partir,
Descobrir se há alguma coisa por trás dessas paredes,
Cavarmos, cavarmos com nossas mãos para sentirmos a vida,
E prevejo que se formos virão outros pelo caminho que fizermos,
Curiosos, sedentos, espantados...
Você não vem?
Você não quer ir?
Eu vou, eu vou porque a força angustiosa que me impulsiona me dilacera
E aqui eu me mexo, e falo, e pisco os olhos, e até faço gracejos sozinho,
Mas eu estou morto, todavia eu-espirito queima aqui dentro,
Como se estivesse gritando, pedindo que vá,
Como se tivesse uma certeza
De que ainda existe esperança para nós...
Para esse dia, para nossas crianças..
Você não vem?
Preciso partir, ir atrás de qualquer brilho...
23.01.13