E os olhos mentem

"É tristeza que os olhos mentem.

É certeza que não sentem.

É um anexo de frieza.

É um complexo de incerteza.

São dias como submundos.

São tantos, tantos mundos...

Se der, quando der, se Deus quiser...

Amanhã é a relevância da inércia presente.

Amanhã, é a mesma frieza que mente.

A máscara dos dias que parecem normais.

Não o são, são só mais inúteis dias,

ruminantes feito animais.

Pois não há saída para alma deprimente.

Pois já não há mais estrada que siga em frente...

Há só lágrima que faz do peito cachoeira,

e mãos que escorregam em alma de cera.

Distrair, sair, fugir, se Deus consentir...

Mas do espírito, já tão ensaboado de incerteza,

o mesmo espírito que deixa quebrarem-se os pés da mesa,

jorra a vontade de não fazer.

Escorre a maldade da preguiça de crer.

De que ponto recomeçar?

De que ponto acreditar?

Em que palavra? Em que sisma?

Em que sina? Em que amanhã?

Se o hoje é tão piamente cego,

e não há mais terapia ao divã?

É repleta de angústia a desesperança!

É encoberta de minúcia a temperança!

Mas, afinal, em que sisma, em que dor,

em que abraço morre a vida?

Morre quando o cansaço toma a vontade tida.

E assim enterram-se almas em porões... adeus!

Encerram-se os corações, tão amados por Deus...

E a respiração enfraquece, volta e revolta, entristece.

Eis que surge o morto-vivo, esperando a morte que não esquece...

E enquanto ainda respirar, ainda há vida.

E enquanto a célula propagar, a morte não se sente convencida.

Mas a alma já está a sete palmos do chão.

Há tempos não há viver, não há ilusão.

E os olhos apenas abertos de relance

Mentem a vida que já está fora de alcance.

O jeito é entregá-los à eternidade.

E estes mesmos olhos que outrora mentiram vida

já emanam saudade...

E os olhos lá longe continuam mentindo

que um dia viveram incessantes.

Mas que na verdade nem ao menos renasceram

pois eram apenas ruminantes...

E dos olhos não se teve notícia,

pois eram incrédulos ateus.

Não teve minúcia ou perícia

que os salvasse junto a Deus..."

Andrea Sá
Enviado por Andrea Sá em 14/02/2008
Reeditado em 14/02/2008
Código do texto: T858596