O SEXTO DEDO.

SEXTO DEDO.

Nascer no cu desse mundo.

Ao lado o cão moribundo.

Com seu olhar tão tristonho.

Escuta um choro estranho.

Ser mais um boi na boiada.

Ser um espectro de estrada.

Cheirar o pó do caminho.

Não faz o seu pergaminho.

Filho de um só pai.

De algumas mães e irmãos.

Tem os dez dedos nas mãos.

Fincados com os seus pés.

Enraizado na terra.

Não chora não pede socorro.

É mudo como o cacto.

Tranquilo como o cachorro.

E sonha com a El Dourado.

Com a barriga vazia.

Sentindo medo e azia.

Dessa partida ilusória.

Imaginando oceanos.

Soluça a dor da saudade.

Matando a fome com sonhos.

Desaba numa cidade.

E fica tão espantado.

Como cascavel do serrado.

Que tromba com o bicho homem.

E foge pra outro mirante.

Olha a torre cumprida.

Mais longa que a sua lombriga.

A noite não tem estrela.

A lua está tão sumida.

E senta no banco da praça.

O frio encolhe seu corpo.

Sua barriga doendo.

E a criança comendo.

E as pessoas passando.

Sem mesmo olhar o seu rosto.

Um pobre cão monta guarda.

Suplica o resto do osso.

Dormiu, sonhou que voava.

Pra sua terra natal.

E era bem recebido.

Pelos seus pais e irmãos.

Saiu de dentro do pássaro.

Com a mulher e seus filhos.

Com sua barba fiel.

Ablando como Fidel.

E colocaram tapete.

Para os seus pés não sujar.

E tinha anéis nos seus dedos.

Os tinham, nove nas mãos.

O seu mindinho sumira.

Na El Dorado sonhada.

Mais isso não lhe tirava.

A pose já conquistada.

E acordou no seu sonho.

Voando pra outros apegos

Ao lado de sua "amarela”.

Com seu vestido vermelho.

Da cor de sua bandeira.

Do lado do seu retrato.

Tomando vinho do Porto.

Com seus amigos absortos.

Naquele pássaro gigante.

Tinha ministro cantor.

Tinha artista do fole.

Tinha até jogador.

E a modelo famosa.

Que num castelo casou.

Mais era feito de areia.

E procurou outro andor.

E alguns drinks depois.

Ela então sussurrou.

Contou um raro segredo.

Falou do seu sexto dedo.

Pro homem tão importante.

Que tão sublime implante.

Dariam rumos elegante.

Seu sexto dedo do pé.

Seria o quinto da mão.

Era preciso moldar.

A dor de tanta emoção.

Aquele homem importante.

Teria enfim os seus dez

Bendita a palma completa.

Bendito os onze dos pés.

Lá vai o pássaro gigante.

Na contra mão do destino.

Levando em suas entranhas.

O sonho do nordestino.

Não come mais rapadura.

O seu feijão com farinha.

Mais sonha com o seu povo.

Com a barriga de ovo.

Aonde vai essa nave...

Que leva no bojo essa ave!

Honorato Falcon
Enviado por Honorato Falcon em 08/03/2008
Reeditado em 01/02/2015
Código do texto: T892344
Classificação de conteúdo: seguro