Annunciata

Ei-nos aqui, século vinte-e-um!

Prontos, então, para testemunharmos as profecias.

Poesias já faltam

Não mais nos deparamos com sonhos

Já dormimos pesadamente,

imprevidentes.

Venham! Não temam desenlaces.

Afrouxamos os laços.

Não temos mais filhos, porvires, palavra.

Ansiosos aguardamos vosso tão prometido caos.

Por favor, não nos decepcione.

Fizemos por merecer...

tudo no script

profanamos, mentimos, iludimos, até amamos!

O que nos falta?

Cansaço? História?

Esta já nos basta, a besta, a bosta.

Estamos aqui, bem gados

Aguardando, mesmo ansiosos,

O derradeiro embate.

Avatares, cá nos vemos, serenos...

Talvez nem tanto

quanto queiram

mas temos em nossas mãos

a vontade de não ser.

É verdade! Ampliamos o debate!

Agora copiamos

nada exigimos

somente compramos

Sabendo que nada mais vale...

Não corram!

Pra que esperar vinte-e-dois?

Esse feijão-com-arroz nos cansa.

Pesa-nos a cruz da rotina.

A sensação não-sabida

Do nada enxergar, do não-crer.

Eu vou chafurdar meus versos

Na lama dos incestos

na dormência dos pretextos

no charque das imobilidades.

No sublime da anorexia, nervosa, latente,

sofrem inocentes!

Em templos repletos de vazios,

coro-me em coro

com as vozes cansadas de nãos.

De que vale a ilusão de salvar-me?