{ Ainda...}

Ainda uso velas, gosto desse tom artesanal e da luz do fogo nas paredes, no grande vazio diante de meus olhos... Coloco uma vela num pratinho de porcelana, enquanto isso, o incenso de baunilha se desacende na casa. Não é que eu seja mística que isso eu não sou. Quando esse incenso apagar coloco outro de canela. Até que a vela dure...

A cidade fede seus miasmas.

Me encanto com a chama da vela a dissolver-se nas sombras. O vazio dos sapatos engendram corpos, e a cera queimando forma uma escultura nascida do tempo se apagando, do entrechoque de luz e sombra, partindo para o nada.

Estalactites.

Eu quero dizer, tento dizer a(s) coisa(s), aponto para o vazio, aprofundo no escuro, e acabo dizendo outra coisa que nem sabia podia ser dita. Ah, mas o que ia dizer mesmo é uma outra coisa que ainda nem sei o que é.

Isso parece que faz a gente ganhar tempo. Mas não é isso a vida? A gente ganha a vida perdendo tempo?

A gente fica achando e querendo que tenha sempre alguma coisa entre as palavras, atrás delas ou depois. Mas não tem nada. O depois é nada, escuro. Pode ser que venha a ser. Agora é. Estamos permanentemente atrelados aos instantes, ao agorinha mesmo. Não tem nada depois, não ainda.

É que na intensidade e urgir do tempo tudo fica assim, chama que se dissolve no ar, nas sombras. Será tem sempre um depois, tem? Depois, aquele cheiro ainda quente recendendo no escuro, sem meia-luz, sem formas, nem sombra, só escuro impalpável.

Meus olhos ardem, pesam. Sinto que vou dormir.

Alessandra Espínola
Enviado por Alessandra Espínola em 30/08/2008
Reeditado em 01/09/2008
Código do texto: T1153576