Amor desgraça adorada

Edson Gonçalves Ferreira

Os ponteiros já cruzaram. É mais de meia-noite, fico pensando no meu amor ou, melhor, bem melhor, nos meus amores encontrados e desencontrados. Nada é definitivo. Nem o estar aqui. Queira encontrar alguém para o sempre. O sempre é só o instante já, porque amanhã é desconhecido. Coração de poeta não tem dono, é janela escancarrada para o mundo. Todos as mulheres e todos os homens cabem aqui, onde a ternura é infinita...

Quando falo de amor, muita gente só pensa em sexo. Amor não é isso. Amor é ilimitado. Só para começar quando se fala de amor, fala-se de Deus. Não quero citações piégas do Livro Santo. Parece que foi Bandeira que disse que os corpos se entendem, mas as almas nem sempre. Ele estava certo. Amor verdadeiro tem que ultrapassar dimensões , às vezes, insuperáveis!

Historicamente, falar de amor é falar confuso. Quem já conhece a história de Abelardo e Heloísa sabe disso. Não é ficção. Pura realidade. Amor é desgraça adorada. Quem ama sofre. Não adianta tentar me convencer do contrário. Completude total não existe. Ninguém nasce junto e ninguém morre junto. Quando eu falo junto, é junto mesmo, num amplexo total.

Quando minha irmã mais velha se casou, meu tio-avô tinha se casado há pouco tempo. Lembro-me de que, na casa antiga da minha mãe, ele me falou para eu casar, se não iria morrer solteiro. Minha língua coçou. Respondi que ninguém nasce e nem morre junto. A segunda mulher dele morreu e, depois, anos mais tarde, ele morreu de velhice, sozinho. Amor desgraça adorada, pois, insisto.

Assim, acredito que a amizade é o amor mais razoável e mais completo. Envolve muito mais o companheiro e a divisão de tudo. Quando se ama, se enlouquece. O desejo mata, muitas vezes, a comunhão. Ninguém pode negar as delícias daquelas horas. São apenas segundos. Agora, o olho no olho, as mãos dadas, a troca de idéias e, principalmente, a cumplicidade durante uma vida, inegavelmente, supera tudo.

Já escuto alguém dizendo que sou atrevido, porque sou solteiro e falo sobre a vida conjugal. Sim, falo, porque casamento não é feito só na igreja. Quem se casa são os noivos. Quem os abençoa é a intenção primeira deles. E quem disse que eu nunca me enamorei e vivi uma paixão que, agora, se transformou numa grande e salutar amizade?

Para mim, o que nos move para amar o outro é a nossa essência divina. Queremos nos completar. Afinal, somos imagem e semelhança Dele e Ele é, antes de tudo, amor. Só que, em nossa fragilidade humana, não somos perfeitos e isso, feliz ou infelizmente, causa impacto no relacionamento amoroso. Amor é eterna aprendizagem, porque é preciso entender que o outro não somos nós.

Sem o calor passional, na sossego da amizade amorosa, o amor se torna mais frutífero, acredito.

São altas horas, estou lúcido, embora tenha tomado um chá de maçã e, quem sabe, o sabor da fruta do Edén, tenha me inspirado para escrever sobre o amor. Não sou psicólogo, nem psiquiatra, nem padre, nem pastor. Sei, contudo, que o amor é essencial na vida de qualquer pessoa. Agora, quando estamos naqueles momentos passionais, amor é mesmo: desgraça adorada, não é não?

Divinópolis, 22.09.08

edson gonçalves ferreira
Enviado por edson gonçalves ferreira em 22/09/2008
Reeditado em 22/09/2008
Código do texto: T1190313
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