Esperava a Hora Incólume do Silêncio

Esperava a sua hora, em silêncio. O quarto estava arrumado para o presente, abrir as janelas e ver correr pelas paredes as imagens que estavam no exterior. Agora – nesta hora – pertence ao espaço a cadeira que baloiça com o peso das imagens novas. Marco contigo um parágrafo

que não termina em nenhuma pontuação. Como um líquido imperceptível que se une a um lago quando se escreve a água dos lábios. Porque escrever é assim: a transparência infixável do que os olhos vêem para além dos vidros das veias. Falo das veias como rasgos, falo dos rasgos

como sílabas em movimento que nunca sabemos. Alcançar um ponto extremo que nem as imagens resistam a prever o redor dos lugares, enquanto os dedos hábeis sentem o coração dos sentidos. O espaço sem divisões, um plano atmosférico em todas as direcções, mesmo se as

viagens intermináveis nos tornassem em imagens de nós num mapa absoluto. Esperar as horas ou as ideias e mergulhar no inconsciente do quarto, ouvir o corpo cair suavemente desde os ombros à sombra de um peso de espelhos, disputar os fragmentos obstinados das sensações

sanguíneas. Não haveria muito mais, muito mais para dizer nos ladrilhos verdes do dia, passam as horas num andar perfeito de aves metafóricas que sempre teremos, sempre teremos sem saber, como essa música percepcionada no ouvido do ar. Esperava a hora incólume do silêncio.