RETROSPECTIVA

Quase chegando na dita terceira idade

Parei com os afazeres normais

Comecei a esboçar um leve sorriso

Algumas rugas se dobraram em meu rosto

Respirei fundo e pensei: que felicidade

Lembrei das coisas faraônicas e banais

Sonhos, mulheres, empregos ou mesmo sem isso

Também de algumas lágrimas senti o gosto

Recordei cada lugar que viajei

Quantas aventuras imaginando o pódio

Com lindas aeromoças sobrevoei

Fazia charme quando as pernas cruzavam

Pedia um uísque ou campari

Com ar de superior e bons modos

Ignorava os petiscos que sempre gostei

Mas as posturas pretensiosas não cansavam

Sempre pronto para uma nova conquista

Sem me preocupar com a beleza

Apenas trabalhar e passear

Boa comida na cama ou na mesa

No colarinho arrumava a gravatinha

Os perfumes eram evidentes

Mas no fundo não passava de um bostinha

Só pensava que era um homem atraente

Quando via um pássaro voar

Aos poucos ia se distanciando e diminuindo

Imaginava que no outro extremo se aproximava

E os demais, o via chegando e acenavam

Quanto tempo durou aquele percurso

Talvez a vida seja assim

Há algumas décadas cheguei e logo devo partir

Nesse tempo penso em mim

Nasci carne, fiz carne e todos cantaram

Então nessa balada da vida tudo curto

Voltei à realidade

Roupas comuns e sem marca

Mas de bom gosto

Cabelos aparados e já grisalhos

Decorrente desta idade

Contando os trocos e tendo algum prazer

Agora passeio pelas clínicas e nas macas

Saboreio as sopas e nem olho no rosto

Caldos, frutas e migalhos

Ao deitar, rezo e peço piedade

Ansiolíticos e esqueço aquele garoto

Mas ainda sobra tempo para reviver