Carente, mas não desamparado

Não. Não estou abandonado. Estou, é certo, carente. Muito carente. Sinto a ausência dela. Do meu cajado, de minha força, de minha luminescência em forma de mulher sublime e perfeita como a imagino, vejo e desejo em meus sonhos; sonhos demasiados obsessivos. Ouso dizer que neste exato momento estou sozinho. Mas se estou só, por que não me acho abandonado? A resposta a essa indagação é simples.

Ela está em mim. Sempre esteve no mais recôndito de meu ser. Essa figura divinal, em meus sonhos mais coloridos, faz-se presente e empunha sua arma para me defender sem me pedir nada em troca.

Amo e adoro esse ser que me abriga das tempestades; que me mata a sede com sua água fresca e cristalina; que me protege dos perigos que imagino existirem e me acalenta quando choro e se agigantam os meus medos infundados.

O nome dessa figura sem mácula? Não digo. Não me convém dizer pelo simples fato de ter a absoluta certeza de que ela existe apenas em minha louca e crescente imaginação.

Querem uma prova de que estou louco? Pois bem, leiam o texto que recentemente escrevi intitulado “Cruel abandono”. Ora, como pode um personagem fictício abandonar um louco e carente mal-amado?

Mais uma vez a resposta é simples: o louco e abandonado é um mentiroso incorrigível. Ele cria seus personagens e depois crer em uma causa impossível atrelado à felicidade sem limites. Isso não existe!

Momentos felizes são possíveis, pois como acreditamos a eterna felicidade é uma utopia. A própria teoria da evolução diz que:

“Evolução, no ramo da biologia, é a mudança das características hereditárias de uma população de uma geração para outra.

Este processo faz com que as populações de organismos mudem ao longo do tempo. Características hereditárias é a expressão génica de genes que são passados aos descendentes durante a reprodução.

Mutações em genes podem produzir características novas ou alterar características que já existiam, resultando no aparecimento de diferenças hereditárias entre organismos. Estas novas características também podem surgir da transferência de genes entre populações, como resultado de migração, ou entre espécies, resultante de transferência horizontal de genes.

“A evolução ocorre quando estas diferenças hereditárias tornam-se mais comuns ou raras numa população, quer de maneira não-aleatória através de seleção natural ou aleatoriamente através de deriva genética”.

Muitos pensam que seu caminho espiritual é o único. Vislumbram a luz de Deus e querem passar isso a todos como se fossem os únicos que mereceram descobrir o caminho certo. E querem a qualquer custo fazer com que os outros sigam atrás deles por aquele caminho.

Pobres ignorantes. Não sabem que o caminho de Deus é o caminho de todos os homens. Todos! E que cada um o segue por um atalho diferente. Não percebem que existe um mundo individual para cada ser humano e que cada um vive imerso nesse universo subjetivo impenetrável aos demais.

Quem não admite essa realidade não é ainda verdadeiramente espiritualizado porque "só o é" aquele que consegue enxergar a Unidade nas diversidades.

O delicado e doce cheiro das rosas enchia o ar da noite. O sol espalhava os seus últimos raios sobre as nuvens que flanavam e flutuavam altas no horizonte sem-fim. Esfriava, e o tempo se tornava ameaçador e tenebroso.

Incansável, o peregrino continuava sua busca. Norteava seus passos trôpegos o aroma sutil de sua motivação recalcitrante. O riso cristalino originário de lábios brilhantes exaltava a fé do homem altaneiro e intimorato dignificando mais ainda sua enobrecida glória na conquista almejada.

Por fim vislumbrou a maravilha em forma de uma mulher semideusa, todo-poderosa, cujo esplendor se traduzia no ocaso do que imaginava na plenitude do seu cansaço, na sede calcinante, nos pesadelos da descrença destrutiva de ideais alvissareiros.

Finalmente encontrou seu oásis, prazer entre muitos desgostos; seu alívio e magnânima consolação. Compreendeu e se fez entender por seus escritos, talvez canhestros, que sempre esteve carente, mas não desamparado.