De pão de queijo a Norah Jones

Se eu paro pra pensar no por que de tanto amor, lembro do carnaval refugiado embaixo do edredom, comendo pão de queijo queimado porque a gente tinha muita pressa pra se amar e esquecia de todo o resto.

Lembro do domingo no zoológico, do elefante filhote que se exibia pra nós enquanto você ria, me beijava, e se jurava tão feliz que eu chegava a pensar que era qualquer espécie de deus, capaz de controlar o quão feliz você deveria ser naquele momento, na frente do elefantinho, enquanto eu me sentia tão feliz que não tinha sequer o controle sobre os meus próprios sentimentos, que eram todos seus.

Lembro da gente andando de “namoradeira” no parque, brigando porque eu dizia que você não pedalava, até ver que a minha corrente estava solta e perceber que havia pedalado em vão por metros, e ainda tinha que recolocar a corrente nos pedais. Sem nem pensar em me ajudar, você continuava rindo, aí eu queria te matar, mas isso só até notar que meus dedos estavam cheios de graxa, o que, somado ao meu amor, me davam vontade de te abraçar, acariciar seu cabelo, seu rosto, pintar teu nariz de preto, aí você não deixava e tudo isso fazia eu te amar ainda mais.

Lembro dos dias inteiros trancados no quarto, com tanto pra fazer lá fora e tanta vontade de ficar. E ficávamos: eu querendo sair pra fumar, e você dizendo que podia fumar no quarto, mas reclamando do cheiro na cortina, da luz do sol, de mim. E, ao mesmo tempo, me abraçando tão forte quanto ninguém mais eu permiti abraçar.

Lembro das eternas conversas ao telefone madrugada afora, quando você dizia que não tinha assunto, e eu entendia que sua mãe já estava dormindo, e que agora podíamos falar o que quiséssemos. E o que nós queríamos era tanta coisa, que o assunto se estendia, e ninguém dormia, e eu te odiava por me fazer perder uma noite de sono, e te amava por me proporcionar uma noite que só era imperfeita porque faltava o seu cheiro, o seu braço, a sua perna em cima da minha. E apesar dessa ausência presente, eu tinha todo o resto, e me sentia o homem mais feliz do mundo.

Lembro dos cachorros que nos seguiam, ou, pra ser mais exato, dos cachorros que nós seguíamos, só pra acariciá-los e lhes dar um pouco de amor e carinho. Afinal, nós tínhamos tanto entre nós, que dividir com os bichinhos não nos traria nenhum prejuízo, e a vontade de fazer isso nos mostrava o quanto éramos parecidos, e nos dava razão pra continuarmos juntos, embora não precisássemos de fato de qualquer razão pra nos amarmos, ou aos cachorros da rua.

A única coisa da qual eu não me lembro é do exato momento que eu achei que não deveria mais continuar do teu lado.

Dia a dia, passo uma parte considerável do meu tempo tentando entender como pude ter sido tão estúpido a ponto de achar que seria capaz de seguir sem você com o mesmo sorriso, a mesma vontade de viver, a mesma esperança...

Procuro nos filmes, nos livros e nas músicas, um sentimento maior que o meu, mais intenso e verdadeiro, mais fiel e mais devoto, e acho tudo bobagem, paixãozinha, namorico.

E durmo toda noite sem resposta, sem explicação.

Porém...

Antes de te conhecer eu não fazia idéia do que era gostar de alguém a ponto de perder o rumo, a cabeça, o emprego.

Não sabia que num mundo tão medíocre, alguém seria capaz de deixar de lado as próprias convicções sobre a existência do tão dito amor, passar a acreditar nisso, e muito menos que esse alguém seria eu.

Isso me faz chegar à conclusão de que, no fim das contas, tudo o que você fez foi me ensinar.

E, tentando ser um pouco lógico, penso que por todas as coisas pelas quais passei na vida, primeiro aprendi, pra depois colocar em prática.

Sendo assim, é impossível que eu esteja perto do fim como já cheguei a pensar, nas noites de sábado em que comecei a perceber que você já não ia mais ligar e me chamar pra dormir na sua casa.

Se eu aprendi com você, isso significa que agora é que chegou a hora de eu amar de verdade.

Agora que eu sou realmente capaz de respeitar alguém como a mim mesmo, de fazer alguém realmente feliz. De segunda a segunda, todo dia do ano, pro resto da vida, ou enquanto durar.

Ou então essa é só a desculpa que uso pra fingir que ainda sou capaz de amar alguém assim como eu te amei.

Se bem que eu acho que é só brisa mesmo. Amanhã de manhã nem vou lembrar.

Com isso, certamente eu vou ler esse texto, ouvir Norah Jones e pensar: e não é que o amor existe mesmo?

E jurarei amor eterno a Norah Jones.

Slash
Enviado por Slash em 16/12/2008
Reeditado em 18/07/2022
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