Ausência

Ausência

Se soubesses o quanto mudei,

Olharia para mim e não me verias;

Ou veria, por mim, a mudança

Através do meu eu transparente.

Se soubesses, ainda que pouco,

O que agora sou,

Não diria se quer uma palavra do que dizes

E calar-se-ia ao confrontar meus olhos

(Não esses que vêem, mas os que se escondem).

Se ao menos soubesse,

Silenciaria os gestos nervosos

E, com parcimônia, abaixaria as mãos,

Como que entregue à sorte.

Porque se realmente soubesses, me desconheceria por completo

E decidiria não ser onde sou.

Se soubesses, saberia que simplesmente sabe ao não saber

Que sou aquilo que sou, e me resumo a isso.

Verias em mim não o que não fui –

Se um dia disfarcei-me, isso não mais existe –;

Verias o que vê e enxerga

E entender-me-ia sem precisar entender que, detrás desse homem,

Existe uma razão de ser, que sempre muda:

Não se contenta.

Ver-me-ia como sou,

Não como uma ausência.