A cor púrpura do Sonho








          No fundo, bem no fundo mesmo, queremos é encontrar o nosso  velho e colorido fantasma.Aquele  eu que podia ter sido e não foi.E de olhos abertos/fechados sonhamos que em uma dessas noites de profunda melancolia, ele sairá da caixa que anima nossas ilusões e penetrará em cada milímetro de nosso corpo inerte e caminhará conosco. Caminhará comigo. Nossas pegadas se unirão na barrenta rua e andarão ao sopro do vento. Sairemos do quarto, talvez por uma fresta da janela, espírito luminoso que serei, varrendo o céu com meus compridos raios.

      Sonho púrpuro, querido sonho púrpuro, imploro em frágil murmúrio, saia correndo. Pule desse quadrado luminoso que clareia a noite escuro do meu mundo, pule comigo e se transforme no que não fui, não sou, não tenho e nunca tive. Pule e se encontre aqui comigo, altivo corpo moreno estacionado estacionado no tempo, ligue os motores de minha coragem e me leve para recomeçar a vida, o passado distante que deixei perder no tempo.

       Em algum lugar do meu sonho, púrpuras sombras dançaram e fui muitos sonhos.
 
       - Quem vem agora? Quem sou agora? Que luz ilumina a sombra que sou?

       Dançarinos na penumbra com esvoaçantes véus passam como nuvens, sonhos,sonhos, sonhos... Não, nunca houve uma mulher como eu, ninguém tão sem vida tantas vidas viveu. Mas um, só um sonho tento reter por entre os dedos, um só, segurar e ser, chave para a vida que não vivi

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          Cellie, querida Cellie, retire a mão que cobre o meu sorriso para que ele se abra para a vida como pétalas de margarida na noite escura.

          Não, nunca houve ninguém como Cellie, que encontrou o caminho de si mesma depois de ter sido mais que nada - negra em um mundo branco, mulher em um mundo machista, feia, mais que feia, a juventude perdida em servir.

          Cellie, querida Cellie, com um  décimo de sua coragem eu não deixaria a vida passar por mim como sombra fugaz.

           Uni, duni, tê, salamê minguê, o escolhido foi você, pra me fazer adormecer!!!

(texto escrito após assistir ao filme A Cor Púrpura - de Spilberg)