C a i x i n h a m u s i c a l
C a i x i n h a m u s i c a l
Primeiro de março 89
“Minha carne é de cinza, minha face é de neve
mas de alto a baixo em palmilho a via férrea;
E quando na noite as ruas são negros defunto,
minha cama na via férrea é um aterro profundo.”
Allen Ginsberg
Toque minha canção
e morra então!
Um dia na floresta andei a procurar algo
que de mim perdera-se.
Pulei de uma cerca e pulei um muro...
pertinho do esqueleto de uma falecida árvore
nada achei de bom.
Disse então ao tronco morto:
- Tocaste minha canção e morreste então!
Lá + adiante numa clareira, de ciprestes rodeada,
procurei por uma dança que meu pedaço carregava.
Mas perto chegando vi que não era isso
o que eu andava procurando.
E a música e a dança de todos dizia:
- Tocamos tua canção e morremos então!
Vi alguém que fugiu e, é certo,
meu pedaço bom para longe levou
e na sua fuga uma mensagem deixou:
- Toquei tua canção e morri então!
Devo talvez procurar só e sozinho encontrar.
Devo talvez rezar, talvez nunca esperar.
Mas sei que há estrelas de um céu
que com meu brilho também se ofuscam.
Jogar-me-ão, um dia desses, uma caixinha.
Uma caixinha musical que dirá, tão bobinha:
- Toco uma canção e morro então!
Toco minha canção.