Dança de confidências

Dança de confidências

Num lugar qualquer apodrece o feixe de trigo

esquecido pelo lavrador cansado.

E é dele que renascem grãos. Assim, fora de seu tempo:

A sorrir, a sorrir.

Eu vejo mão que mata mosca-bailarina.

A suja e adultera bailarina do doce e do barro.

Dia a dia eu vejo a senhora de feridas pensar

na hora exata de seu relógio quebrar-se.

Na esperança do homem sentado, a vida passa-lhe jovem,

cuspindo em seus remendos.

Eu o vejo cansado e nem é agora

Que pode ele desistir-se. Não tem direitos...

... e o Governador o desconhece!

Na fria madrugada o grande senhor e seus admiradores

esperam que ele recolha o lixo e a vida morta.

Porque ambos devem para longe ir.

A namorada então, dessa cidade parte não faz?

É claro que nos meus pensamentos

há um quartinho para que ela descanse

Conheço-a e ela me conhece.

Por isso, não há nem palavras...

...nem palavras, nem palavras.

Eu vejo a última estrela

e o brilho que lhe esgota a vida.

Eu vejo a lua do ar e mariposas do lar,

que de cansaço e bobagens, exaustas ficaram!

Querida mulher que do sonho fugiu,

e numa loucura sutil convenceu-me que é linda e poderosa!

Eu vejo a pedra onde sentada de achas.

Vejo a tarde longe onde cansada, então em nada ficas.

Casa bonita e úteis farrapos!

Tudo ajuntado nas manhas de trabalhos.

Deitado na rede, esperando a noite!

A vida a isso num dia resume-se.

Basta que eu veja a necessidade de tamanha felicidade.

Onde, no dia que acaba, a desgraça se esconde?

Porque pescas teu alimento e trazes com ele a ruína?

O amor é o que também ainda posso ver.

A mulher de bonito vestido cor-de-rosa espera um dia,

e no outro, de ódio veste-se.

Mas mesmo que em noite vire-se o bom sol,

é de se esperar que tudo tem a capacidade de mentiroso ser.

Porque ainda digo: eu vejo a aranha fugitiva e sua presa consciente.

E o espectador ausente.

Todos juntinhos esperando que a cigarra, o grilo e o sapo

movimentem a sua banda e que todos então, dançar possam e esquecer consigam.

Coisas bonitas que só em pequenos instantes deixam-se viver.

Por isso, rápidos devemos ser e esquecendo o sofrimento,

subir no telhado, afugentar os ratos e só então descansar ao relento.

Mas por ser tão cedo ainda, adio outra vez a viagem

e só o que vejo é a minha cegueira. A minha imensa.

Um silencioso tambor

toca em meio às ruínas

do que ergueu-se ao sol.

Toca gemidos sem amor.

Toca visões

e afugenta mendigos.

Morre o dia!

Morre a noite!

Agoniza a madrugada!

Senhora, que é feito do ácido?

Do ácido de teus olhos?

Morre o enamorado.

César Piscis
Enviado por César Piscis em 25/06/2009
Código do texto: T1666004
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