Quando eu crescer...

Quando criança, tinha sonhos de gente grande. No espelho do futuro, via a imagem da mulher independente, auto-suficiente, viajante, falante etc e tal. Projetava um estilo de vida livre, liberto das pressões econômicas e sociais. Pensava na formação, na profissão, pensava enfim, na vida que a família e a sociedade esperavam de mim. Pensava, projetava, analisava as possibilidades e as improbabilidades. Em nome dos tais "projetos de vida" , adiei pequenas e grandes alegrias,  tempos de ternura, momentos de cumplicidade tão necessários à formação de qualquer adolescente. Em nome dos projetos profissionais, fiz escolhas totalmente incompatíveis com meu jeito de ser, enveredei por caminhos desconhecidos, por mares nunca antes navegados, olhava o mar e esquecia que era tão insignificante diante de sua magnitude, olhava o horizonte e não percebia o mistério que o envolvia e que nos trazia aquele imenso desejo de tocá-lo. Talvez porque a objetividade da lente dos meus olhos só conseguisse visualisar o desafio. E nesse caso, tocar aquilo que é dito impossível, nos traz uma certa validação tão necessária ao mundo dos mercados. Em nome da tal perfeição, desenvolvi uma certa intolerância à possibilidade de errar, esquecendo que isso é um passo necessário para o apredizado. Em nome da independência, criei muros de auto-proteção, criei fantasmas imaginários, medos infundados, sonhos calculados. Nem sequer havia experimentado as crises da adolescência, já estava saltando para o mundo adulto, discutindo política e economia com o mesmo conforto que falava de um capítulo de novela. Quando percebi, havia pulado uma fase muito especial de minha vida. 

Quando os projetos de vida, começaram a se materializar, vi que algo havia ficado do meio do caminho. Na minha maleta de sonhos, havia um histórico acadêmico nota dez, títulos adquiridos, prêmios e reconhecimentos. A mala estava cheia. Cheia de lembranças empoeiradas, de vaidades adquiridas, de honrarias conquistadas. Foi então que percebi, que aquela mala era pesada demais pra carregar durante a jornada. Me rebelei, troquei a mala de vaidades pela mochila do  imprevisível. Uma mochilinha pequena, com sonhos mais leves, porém muito mais intensos e necessários à minha realização pessoal. Troquei os planos pelos sonhos. Já não queria aquela tão desejada independência, descobri que ela vem acompanha da solidão, de frio. Abri mão do conforto material, pelo aconchego do colo, pelo calor do abraço, pelo cheiro de carinho, por um momento de ternura. Já não queria ser sabedora de tantos assuntos, queria saber falar de amor, queria saber cantar o amor. Já não queria conhecimento empírico, queria sabedoria espiritual, paz interior, luz e harmonia comigo mesma. Somente assim, poderia expulsar todos os monstros que habitaram meus pesadelos e ir ao encontro do encanto. 

Minha mochila agora é amassada. Não tem nome nem marca. Joguei fora as etiquetas, pois me lembravam a prisão das conveniências sociais; joguei também, todos os títulos que me rotulavam e me sufocavam na saia justa dos padrões socialmente estabelecidos. Descobri que meus sonhos haviam sido pirateados. Eram clones de expectativas e desejos que não eram meus, mas dos que me rodeavam e me fizeram crer que há apenas um caminho de tornar-se um vencedor. Mas me recuso a ser vencedora de uma batalha de vaidades. Quero ser feliz e a jornada é longa e por vezes, por demais dolorida. Quero sonhar de novo, acreditar na possibilidade recomeço, me permitir sentir o sabor do erro, poder olhar minhas cicratizes e saber que foram adquiridas durante o caminho por mim escolhido. Não posso voltar no tempo e refazer as escolhas, mas posso iniciar um caminho novo, com novas possibilidades e diferentes dimensões de vitória. Quero me sentir criança outra vez; quero sonhos renovados em passos lentos e pés descalços e quando alguém vier me perguntar o que eu quero ser quando crescer...vou responder em alto e em bom tom: Eu só quero é ser feliz!!!




* Arte digital by Márcio Farias
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