COMO ERA BOM!

Lembrando-me das cascas

- com o peito em lume; o resto, na banca de jornal -

Ah, quantas cascas!

Eram serenas... tão dóceis!

Como as flores sem nome que os poetas adubam e emudecem

Noite em nostalgia.

Havia magia, sorvia-se essência

Pela luz que há na greta, havia!

Pelo átimo a resvalar na incerteza da adolescência

Eu, a amplidão, a vala e as frestas

Por onde se enxergavam as ostras, preenchiam se os alvéolos.

Através da tarde sabor manga coquinho

Deixávamos fluir o mel precioso, tão cioso, tão fausto!

Dava para se enjoar da magnificência ébria de luz

E havia pus!

Dotava-se do antídoto, das verdes matas e das sombras

Precisava-se de mais: tínhamos; a juventude em plenitude, o ócio em polvorosa.

Como era bom ser jovem!

Como era vida desgarrar-se das anáguas do passado e se tornar intrínseco do porvir

[como coelho faz seu álbum, como água a sumir de vez]

Na consistência desmembrada das manhãs, reviver intensamente

À mercê da exclusiva ignorância real dos sentidos

Quanta ambigüidade, tanta incoerência!

Mas é esplendorosa a incoerência

É cor de lata amassada, de merenda escolar, de prova de matemática

Ainda ouço aqueles cheiros todos encaraminholando angústias e indo ter com a sorte no baixio da escada...

[cascas de parede desmaiavam de rir]

Como era bom ser jovem!

Nem mesmos as mais amargas nuvens de fel e grinalda ousavam fazer mal

Era-se protegido por leis sobre as quais eu não sei discorrer

Mas, cometiam-se tantos erros; tão desmesuradamente deliciosos, os erros

Que se ignorava a suculência dessas cascas que nos viam de pijamas todos os dias

A começar pelas almas de todos

Ah! Como era bom...

Cesar Poletto
Enviado por Cesar Poletto em 09/09/2009
Reeditado em 10/09/2009
Código do texto: T1800934
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