Pequena história de uma morte anunciada

Alguém que sentou a esta mesa morreu.

Matava-se aos poucos, dia-a-dia,

com álcool e nicotina.

Inspira pena e poesia.

Morreu nova, corpo velho,

mulher que parece nunca ter sido menina.

Nada sei de sua história, além do que me contaram.

E me contaram muito pouco, quase nada,

e, o pouco que sei era só tristeza.

Por isso, talvez, tanto empenho em matar-se à mesa.

O riso fácil enganava os incautos, inclusive eu.

Um olhar mais atento perceberia os olhos tristes.

Quando aspirava a fumaça do cigarro

dir-se-ia que chamava para si as dores do mundo.

A fumaça que soltava lentamente pela boca e nariz

Levava um pouco de sua alma volatizada.

Esta velha mulher a quem só conhecia de vista e de histórias

Sempre com companhias duvidosas e tristes, dizem,

morreu só.

Alguém que ao menos seu nome sabia

soube da morte pelos jornais

numa notícia de pé de página.

“Suicida é encontrada na Bela Vista”

Assim eu soube seu nome, que tudo dizia sobre seu maior desejo,

Maria do Socorro morreu sem ser socorrida

em toda sua triste vida.

Ouro Fino, 19 de março de 2005

Baseado em um fragmento de história escrito em

Juiz de Fora em julho de 2000