estância solitária

Não existe mais o fragor da bronca vibrando os corredores das pedras, nem mesmo o ranger das pernas de madeiro sob o choupo-branco, nem a sombra da silhueta austera que arrefecia o chão de terra socada, nem o olhar do Sinhô estático para o nada. Não existe mais a folha seca do tabaco e nem o cachimbo sobre o mármore, calcário obsoleto, pedaço de pedra fria sem vaidade. Sequer a palha sobrou, não há centeio e o cabano é farrapo esquecido, perdeu o garbo das grandes abas e no oco dele ronrona o maltês. Não existem mais as leiras de cana doce perfumando a terra e nem o melaço de caçarola a cozer sobre o fogo de lenha. Não há pão ou o folhado de manteiga e nem dedo de geléia framboesa, falta o odor do café moído escorrendo no tecido de coar. Não existe mais a primavera na estância do Sinhô, sementes não germinam para flores ou frutos, apenas brotam apegos do passado, um verde mirrado amanhecido em rocio. Antes de não existir o nada se ouvia o vozear e via-se o Sinhô e seu cavalo, a explorar o pasto no trato do boi que era barroso e desse, o boi, restou o arcabouço no descampado do rio seco, hoje, córrego das minguas. Nada existe na estância, quer-se o Sinhô meu Pai. Ele detém sobre o olhar exânime o solo do não existir chovido da minha saudade.

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