Dom de Mendigo

Encontrei um verso, já bem desgastado

Perdendo o viço na alma de um mendigo,

Ferido,

Mas ainda iludido,

Diz que ladeou a vida através de porta sem trinco.

Sem saber escrever compôs odes em delírios,

Em ladrilhos.

Sonhava insone, comer pão e colher lírios.

Assoviava árias tristes aos donos do futuro,

Como se fosse ele, uma cena de teatro

Todo em trapo,

Numa languidez esperançosa, de fino trato.

Tinha nas mãos calos e marcas de adeus,

Seu catre não tinha paixão nem encantos,

E nos cantos,

Coisinhas e andrajos e pedaços de santos.

Ao léu, seu dia não tinha faina, e sim orações

De um viver sem amores mesquinhos,

Sem torvelinhos,

E hoje, a dividir migalhas com passarinhos.

Ele era um verso de humilde pomposidade,

Igual borboleta que não conhece espelhos.

De joelhos

Tenta descortinar o humano sem rodeios.

Nadilce Beatriz
Enviado por Nadilce Beatriz em 02/10/2010
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