ENTRE DESENHOS E IMAGENS

Voltei ao mesmo lugar de outrora. Revi todos os caminhos que me levavam a você. Caminhei por suas ruas curvas e desenhei, em pensamentos, as curvas que alegravam o meu viver. Meditei sobre o ir e o vir, sobre as intempéries, sobre o sofrimento, a solidão e, principalmente, sobre a separação. Em todos esses momentos, a luz opaca do que ficou lá longe me acompanhou, mostrando que a distância pode ser – e sempre será – um dos pontos mais vulneráveis em uma história de amor. Não reclamei, no entanto, apenas sorri, já que a pasta chamada “saudade” nunca deixou de ter, em seus arquivos, boas lembranças. Por isso, não senti tristeza, nem me deixei cair em desânimo, pois todo o enredo deste amor vivido foi feito de bons e duradouros momentos. Assim, não reclamei. Pelo contrário. A sensação de bem-estar e de leve arrepiamento esteve sempre comigo, me acompanhando pelos desenhos que foram traçados pelas imagens que iam se passando, aos poucos – e seguidamente – em cada aclive (onde a visão era, momentaneamente, interrompida em seu início, para depois mostrar a beleza pintada com pincéis divinos, da maravilha chamada natureza das águas) ou declive (que sempre me levava ao paraíso – margeando o que antes era mata virgem e, no qual, depois de desvirginada, se entregava ao prazer mundano, partilhando seus desejos com meros mortais à procura, também, dos prazeres físicos) por onde eu passava. Em cada esquina, de cada rua ou avenida, pequenos recortes íntimos de nossa presença: o cantinho das conversas triviais e, até, filosóficas, da tribuna caseira feita um confessionário, onde as verdades eram ditas de forma amena ou sem amplitude, já que o etílico se tornava mais forte e tirava – mais tarde – o amargo da confissão; das andanças em busca de onde parar – por vezes, motivo de criancices – e o parar para olhar o raiar do dia, ou então, o dia que amanhecia acompanhado da necessidade do regressar à realidade de uma rotina que nem sempre era a de contos de fadas. Tudo isso não me deixou sentir melancolia. Mas senti a falta de não estar sendo escoltado pela sua presença, desta vez. Deste modo – e querendo percorrer todo o curso de uma era –, vesti-me de saudade e naveguei em direção ao seu perfume, que sei, ainda continua a inebriar, mesmo que, por vezes, eu não consiga distinguir se foi de ontem ou se é do mesmo dia a fragrância que ainda perfuma o meu olfato. Nem isso me desanimou. Continuei a navegar, desta vez, no verde/azul do seu lago que, ao vislumbrá-lo, emprestou, à minha visão, a memória da criança que brincava por suas areias ardentes e que, um dia, me confessou que foi onde, pela primeira vez, viu um beijo sendo dado. Ainda está por lá, apesar de que, o que resta é resquício da natureza depredada, esta, para poder servir à modernidade dos nossos dias. Não me importei. Fui ao encontro, em seguida, de suas águas, de seus banhos. Atravessei o seu arco maior, desci pelo lado norte e menor, e vi, lá de baixo – olhando para o céu de seu esplendor – a beleza gravada em um poema que, ao fazê-lo, senti todo o frescor de seus versos vivos em mim, feito expectativa de quem conserva a esperança como modelo de bem viver. Porém, fiquei lá por pouco tempo. O desejo de regressar aos antigos lugares em que delineávamos nossas marcas, fez-me voltar rapidamente para o centro de minhas memórias. Refiz o caminho tantas vezes percorrido: ora por entre a selva de poucas casas, ora por asfalto quase quente de suas manhãs/tardes e, aqui e acolá, noites enluaradas, mesmo que olhá-las significasse perder preciosos minutos de aconchegos. No entanto, esses caminhos ainda são inconfundíveis: neles, o amarelo de suas árvores se confunde com as frondosas galhas que alcançam os beirais da sacada de seu castelo e que sempre me deram a impressão de que o céu ficava mais perto do que realmente era; isto, sem tirar o desejo de continuar no paraíso daqui da Terra, em meio a urros de prolongados prazeres. Em meio a todos esses redemoinhos de tempestivas saudades, a estrada da minha vida me levou para o adeus de nossas almas. Feito nave que sobe por entre o infinito do universo, uma pausa em nossos sentimentos. Não foi, também, triste. Não. Foi uma despedida antecipada, mas cercada de zelo e carinho. Olhamo-nos e escrevemos, em nossos cadernos, a data da partida. Não programamos – em nossos radares –, o retorno, vindo das galáxias distantes, da carruagem de fogo que a levou para os confins do espaço. Mas – e apenas – selamos o compromisso de manter aceso – feito a chama ardente da paixão – aquilo que sempre nos uniu e que nos une até hoje: o amor. Destarte, a tristeza não tem vez em meus pensares e o filme passado apenas me dá a sensação de que, em breve, recomeçaremos a caminhar, desenhando novos caminhos e trilhando versos e rimas de sonhos e fantasias...




Obs. Ladeira do Sol - Natal.

Raimundo Antonio de Souza Lopes
Enviado por Raimundo Antonio de Souza Lopes em 05/12/2010
Reeditado em 06/04/2011
Código do texto: T2654455
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