PAUSA INTERMINÁVEL

- Cada qual dá o que tem, minha mãe já dizia.

Ele, no caso, tinha fome e não era dali.Fome vinda de La Guajira e ida pros ônibus de Quilla a pedir.

Ele, no ônibus, tinha fome - E não era dali. Fome de estar ali é que não tinha. Mas ainda assim dava sua mão, de passageiro em passageiro. Manos frías, flacas à gente essa que nada entendia.

"Yo no soy de aquí" disse seguido de pausa.E a fome era tamanha que chegou a pedir um prato de sopa no ônibus.

Ele , vindo de La Guajira, no caso, era o retrato do descaso que, hispanohablando forçado pelo acaso que é a fome, o fazia pausadamente. Não oferecia galletas, servilletas, pulseiras, cartão de natal ou quebra-cabeça. Somente a mão fria, flaca

e os olhos profundamente negros

e pequenos

e os lábios inchados

no seu menos- rosto de magreza.

"Y quién me pueda ayudar con una moneda o un plato de sopa". E a pausa interminável. "Tengo hambre".

Se pudesse ele alimentar-se da frase, estaria saciado. Passou seu boné que voltara à cabeça cheio dos silêncios recolhidos de cada passageiro. (Daí as pausas - creio.)

Passa no ônibus cruzando pelo corredor com um vendedor ambulante. Ele desceu resignado. Enquanto isso, no "Carreira 54" seguiu em movimento tudo que em Barranquilla permaneceu parado...

Juliana Santiago
Enviado por Juliana Santiago em 11/12/2010
Código do texto: T2666342
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