PAUSA INTERMINÁVEL
- Cada qual dá o que tem, minha mãe já dizia.
Ele, no caso, tinha fome e não era dali.Fome vinda de La Guajira e ida pros ônibus de Quilla a pedir.
Ele, no ônibus, tinha fome - E não era dali. Fome de estar ali é que não tinha. Mas ainda assim dava sua mão, de passageiro em passageiro. Manos frías, flacas à gente essa que nada entendia.
"Yo no soy de aquí" disse seguido de pausa.E a fome era tamanha que chegou a pedir um prato de sopa no ônibus.
Ele , vindo de La Guajira, no caso, era o retrato do descaso que, hispanohablando forçado pelo acaso que é a fome, o fazia pausadamente. Não oferecia galletas, servilletas, pulseiras, cartão de natal ou quebra-cabeça. Somente a mão fria, flaca
e os olhos profundamente negros
e pequenos
e os lábios inchados
no seu menos- rosto de magreza.
"Y quién me pueda ayudar con una moneda o un plato de sopa". E a pausa interminável. "Tengo hambre".
Se pudesse ele alimentar-se da frase, estaria saciado. Passou seu boné que voltara à cabeça cheio dos silêncios recolhidos de cada passageiro. (Daí as pausas - creio.)
Passa no ônibus cruzando pelo corredor com um vendedor ambulante. Ele desceu resignado. Enquanto isso, no "Carreira 54" seguiu em movimento tudo que em Barranquilla permaneceu parado...