Testamento

Há o momento em que é preciso morrer

Porque a dor é tanta que é insuportável permanecer

Se tudo vegeta e vai embora, no compasso natural das coisas

Deixem o espirito ir, desembaraçar-se de velhas quinquilharias

O que é morrer senão um espasmo

Um desmembramento entre o corpo e o espirito

A vitoria do sutil sobre a matéria bruta

A consagração da eternidade?

Porque querem que eu fique

Em meio a esta promiscuidade

Entre o bisturi e o antibiótico

Os catéteres e as bactérias?

Quando eu cair no palco

Ficar desnudo no grande circo

E emudecer meu recital

Que me perdoe esta plateia febril

Quando se perde a importancia de gerir a vida

De pintar os lábios de felicidade

De colocar mel na saliva

E perfumar o colo para um novo amor

Não apliquem tubos na garganta

Nem coloquem freios em minha boca

Eu só preciso gritar com vigor:

Respeitem o meu momento de ir embora!

Quando sonhar não vale a pena

Não vale a pena viver!