Dizem que o primeiro olhar nunca se esquece. Concordo. Mas, devo confessar que só aos poucos vamos refinando e suplantando a primeira vez. O primeiro olhar é mais marcante, mas com o passar das horas, dos dias, vamos afinando o olhar, aprendendo a ver, e conseguindo ver além do simples olhar. O olhar amadurece, torna-se seletivo. Passa-se a buscar o essencial, não mais se detém no sem sentido.
       O primeiro ato de amor, por exemplo, nasce de um olhar. Olhamos, descobrimos e nos apaixonamos. Daí acontece a entrega. Movimentos desencontrados marcam o momento. E o desejo esperado fica longe do real e é substituído por uma quase frustração. À medida que o tempo passa vai se aperfeiçoando, vão acontecendo descobertas, vão surgindo novidades. Um dia,o  amor amadurece, se completa. É então que um só olhar já bastará para fazer disparar o dispositivo, um simples olhar será um convite e um aceite.
       Mas, nem sempre o primeiro olhar é o que fica. Muitas vezes está carregado de emoção distorcendo a realidade. Lembro perfeitamente a primeira vez que vi neve. Fiquei parada, muda de emoção. Eram flocos brancos, líricos, perfeitos. Era um cartão postal natalino, era bem mais do que eu via nas telas. Veio o segundo dia, somando-se a tantos a tantos outros. E a neve perdeu a magia. Tornou-se enfadonha, fria. Onde a pureza? Logo a neve virava lama, uma lama grossa e escorregadia onde afundavam meus pés. E o primeiro olhar foi esquecido. Ficou a imagem da lama.
         A mutação do olhar é visível. A força do olhar, incalculável. Se amamos, vemos tudo colorido, se perdemos o amor, tudo enegrece. Impossível o olhar não obedecer ao coração.
        Deve ser por isso, que apesar da chuva forte, as cores estão tão carregadas hoje. O vermelho da paixão impera. Deve ser porque hoje é domingo, um belo dia para se olhar e esperar que esse olhar não mire fogo-fátuo, mas sim uma esperança de um arco-íris perene, intenso e colorido.