ERAM CRUZES DE CAL


            O asfalto era simplesmente asfalto. Nem mais, nem menos que esses milhares de quilômetros que vão avançando, avançando, esquentando, esquentando, enegrecendo, enegrecendo... Muitas vezes invadem trilhas, campos, vidas, invade o que estiver pela frente, pouco importa o que seja. Sua negritude se espalha tal qual larva de vulcão e vai engolindo tudo.
          Seguia em direção a Natal. E lá vinha o asfalto querendo dessa vez tomar o lugar de centenas de àrvores. E logo, tristemente, vejo homens colocando cruzes nas árvores que deveriam ser sacrificadas. Aquilo me doeu. Vontade de abraçá-las, de protegê-las. Eram cruzes de cal. Mal cruzava uma e outra era cruzada. Sinal de morte na cruz de cal. No verde da folhagem, uma cruz de cal indicava morte. Era uma vida por uma asfalto. O verde pelo negro. Eram centenas de vidas por um asfalto.
           Mas, essa àrvore era dona daquele palmo de terra, dava frutos, dava flores e ainda sombra aos passantes. Essa àrvore era uma relíquia da Mata Atlântica.Sobraram tão poucas. Mas de nada valiam diante do poder econômico do asfalto. Ela tombou, as outras centenas também. E ningúem viu... e tantas pessoas passavam naquele instante e nem perceberam que com as cruzes de cal foi-se uma, duas, centenas de vidas.
          Perdoa mangabeira, arueira, cajueiro, imbaúba, mas eles sabem o que fazem.