Excremento social.

Eis que aqui estou, pelos meus pais, a miséria me foi deixada de herança, perdi meu trabalho, minha família e roubaram até a minha esperança. Extrínseco da sociedade, dela só me restou o desprezo, agora eu espero a minha morte, aguentando as algias sem sossego.

Tornei-me um escatófilo, mal enxergo as paredes arredondadas e os intermináveis corredores da minha casa, pois a minha córnea esquerda já vendi junto com o rim.

Minha barba, que se enrosca em meus cabelos, serve de morada para alguns insetos, as antenas das baratas fazem cócegas em meu esôfago, o caminhar das caranguejeiras massageia minhas costas, o barulho das descargas é a música que ouço.

Tenho asco dos jornais, dos jornais que me servem de cobertor, pois as notícias que eles trazem, quando não é pavor, é horror: Homicídios, latrocínios, genocídios, tantas atrocidades; verbas desviadas, orçamentos quadruplicados, safras que apodrecem...

Com absoluta certeza eu me orgulho de ser mais “limpo” que estes homens dos jornais, mas quem se importa? Quando eu morrer, nem os ratos se lembrarão mais!

Eis que chegam em meus ouvidos as vozes dos ventos, tomara que não tenham roubado a minha paz eternal, então perguntarei:

Por que o meu veredicto foi a culpa de ter nascido?