A outra

O fenômeno absurdo já não a assustava mais. Na primeira vez quase desmaiou, mas depois foi se acostumando com a presença da outra pessoa no espelho. Há vinte anos acordava as sete da manhã, passava um chá de camomila com boldo, sua combinação predileta, e alongava o corpo durante quinze minutos. Abria todos as janelas e procurava respirar uma quantidade de ar para o dia inteiro. O frio nunca a espantou, as vezes o sol é que a incomodava. Logo após seu café da manhã de "ar", ia para o banheiro e se encarava diante o espelho. Há vinte anos que ela vê outra pessoa, não sua imagem, mas a de uma mulher diferente do que ela é em diversos aspectos - a cor da pele, do cabelo, as formas do nariz, boca, o tamanho do crânio, e entre outras características que definitivamente não era a da mulher que ela via quando chegava em casa. Passaram-se mais dez anos. Ela decidiu não mais olhar pro espelho. Após uma semana sentiu falta daquela outra mulher que sempre via após o seu despertar.