Sentidos

Diziam os antigos,

Que a boca foi feita para escutar

E o ouvido para conversar

Daí o ditado:

"Escuta com a boca e fala com os ouvidos!"

Os antigos falavam, discretamente se ouvindo

Quando purificados eram, o ouvido e a fala

A linguagem se transformava em ato de nobreza

Os oráculos da antiguidade conversavam entre vapores

Os amantes, entre olhares conspiradores!

" A lingua é o chicote do corpo! "

Dizia minha avó, e depois silenciava!

Se recolhia em liturgias e benzições.

Era uma feiticeira de encher os olhos

Italiana da gema, benzedeira, rezava em latim,

E outras linguas que se perderam no tempo.

Sabia destas coisas de "mau olhado", quebrantes,

E o veneno que produzia a "língua bifurcada".

Meu avô, cantor de árias, barítono,

Costumava recitar monólogos, ora cômicos, ora dramáticos:

" Caveira, quem te matou?"

- A lingua meu senhor, a lingua, a lingua!

Esta cortesã insaciável, que copula com a saliva

Quando tem por perto uma mulher fatal!

Esta vilã corrompida que desata da razão,

E joga pais contra filhos, navios contra navios,

E até o diabo contra outro diabo!

Silenciemos então!

Não permitamos que da boca, que foi feita para a louvação,

E a graça do alimento, saiam víboras peçonhentas!

Tem gente que não merece a fala, tem gente que não merece

os olhos, e muitos que não deveriam ouvir!

Se o senhor permitisse somente aos justos, a virtude de falar,

A terra seria o mais belo jardim da criação!