ATÉ QUE PROVEM O CONTRÁRIO

Você continua com suas velhas cartas, seus melancólicos choros e suas músicas desafinadas...

Nada pra você mudou, nem o tempo que te apressa incomoda... Nem a hora que se finda te leva ao desespero...

Você é zero emoção, não se comove, não se envolve e não se move, é inerte...

Sempre com seus conceitos indestrutíveis e suas certezas religiosas, sociais e politicamente corretas... Você simplesmente não vive, você vegeta!

Tanto faz pra você qual é o dia da semana, a que horas começa qualquer coisa... Importante? Não existe em teu dicionário...

Não tem gosto, também não tem desgosto... Você ama o “tanto faz” e pra você “qualquer coisa serve” e “nada serve”... Odeias as escolhas...

Ignorando leis, você não faz perguntas, só tem respostas... Não tem curiosidades, objetivos, desejos ou vontades...

És fria, és fúnebre, és morta...

Quem te moldou assim foi o tempo, as decepções e a ausência...

Você não me diz, mas eu sei... Sempre quieta, independente, presente, descrente...

De nada sofre, não tens angústias, nem desvarios... Cultua o “ser sozinho” mesmo não podendo ser ausente de si mesma, carregas um grande vazio...

Teu caminhar é lento, tua respiração é muda, tuas palavras são pensamentos...

Introspectivamente mimetizado são seus anseios, suas verdades e seus medos...

Eu te conheço tão bem, tenho ciência de tuas razões, de tuas hipóteses e de teus axiomas...

És científica, planejada e calculada... És alquimista, experimentada e infundada... És misteriosamente complicada...

Não esperas, não prometes... És réu, juiz e promotor que promove tua própria sentença, avalia tuas culpas, pondera tuas penas...

Igual uma noite escura, muitas vezes causas espanto e uns vislumbram em ti beleza, o que é estranho, outros até te pintam em tela, mas apenas em preto e branco...

Amiga inseparável dos sábios, inimiga feroz dos gentios... No entanto amizade pra ti é indiferente, eles geralmente te procuram... Nunca saiu de casa pra ser “boa praça”, teu egoísmo não deixa, tua presunção te bloqueia, tua natureza invalida...

Em doses homeopáticas fazes bem... Tua overdose pode levar ao caos...

Mística, silenciosa, equilibrada... Precedida geralmente de momentos bons e maravilhosos, que quando se findam te deixam à porta de casa...

Invisível e forte... Vazia... Horizonte de eventos denso... Infinito... Nada, nem ninguém escapa de ti...

E porque tens que existir? Será que apenas pra viver na arte, na música ou nos poemas? Pra atormentar corações e dilacerar sentimentos? Ser companheira fiel da “não-presença”...

Solidão...

És um presente ingrato, és o bem e, até que provem o contrário, também és o mal necessário...

Gleidson Melo

gleidsonmelo
Enviado por gleidsonmelo em 21/07/2011
Reeditado em 21/07/2011
Código do texto: T3110297
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